Coluna Meio Ambiente : Centro de Estudos da Amazônia Sustentável é criado pela USP para acelerar o desenvolvimento da região
Enviado por alexandre em 28/04/2023 00:45:21


Centro vai buscar produzir conhecimento técnico-científico para enfrentar os desafios relacionados a aspectos territoriais, como no caso do garimpo. Foto: Arquivo/Agência Brasil

O Centro de Estudos da Amazônia Sustentável (Ceas) é um dos quatro novos centros lançados em março pela USP – os outros três são o Centro de Agricultura Tropical Sustentável (Stac), o Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical (CCarbon) e o Centro de Estudos e Tecnologias Convergentes para Oncologia de Precisão (C2PO). Sob a coordenação do professor Paulo Artaxo, do Instituto de Física (IF) da USP, e a vice-coordenação de Gabriela di Giulio, da Faculdade de Saúde Pública (FSP), o Ceas tem como principal propósito a produção, integração e disseminação da ciência, por meio de atividades acadêmicas e científicas inter e transdisciplinares relacionadas ao ensino, à pesquisa e à extensão, para o desenvolvimento sustentável da região.

"A Amazônia é uma região estratégica para o Brasil e para o planeta como um todo, e temos muito a aprender sobre seu funcionamento físico-químico e biológico, bem como sobre suas complexas interações socioeconômicas e institucionais",

afirma o professor Paulo Artaxo.

As atividades propostas para o Ceas focam a preservação da biodiversidade e da cultura dos povos originários, o uso sustentável dos recursos naturais, a ampliação de esforços para mitigação de emissões e adaptação às mudanças climáticas e para a melhora de condições de vida das populações, considerando toda a diversidade étnica e populacional (povos da floresta, ribeirinhos, comunidades quilombolas e os residentes das áreas urbanas) e os paradoxos e complexidades amazônicos, salienta a professora Gabriela di Giulio.

"O futuro da Amazônia em vista das mudanças climáticas e o desenvolvimento de um novo sistema econômico para a região, explorando de modo sustentável sua sociobiodiversidade, também estão entre os estudos propostos pelo Ceas", acrescenta o físico, que é membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC (acrônimo de Intergovernmental Panel on Climate Change).

Assim como os demais centros, o Ceas pretende integrar atividades realizadas em vários institutos e departamentos da USP. Segundo Artaxo, é preciso buscar alternativas visando a um novo modelo de desenvolvimento socioeconômico da região da Amazônia, e o desenvolvimento de ciência básica e aplicada por parte do Ceas pode dar importantes contribuições para alcançar esse objetivo. Como ele afirma, "usaremos a ciência para propor modelos e prever cenários de desenvolvimento sustentável, baseados no funcionamento físico-químico e biológico acoplado às suas complexas interações socioeconômicas".

"O atual modelo de desenvolvimento amazônico não é sustentável, ele não explora as melhores oportunidades e potencialidades para a região amazônica, nem tampouco distribui renda entre seus habitantes. Pretendemos desenvolver pesquisas sobre questões ambientais e climáticas, questões associadas à biodiversidade, aos modos de vida dos povos amazônicos, trabalhando a sustentabilidade da Amazônia de maneira integrada às várias áreas de conhecimento da USP, em colaboração e parceria com pesquisadores que trabalham em instituições amazônicas."

Paulo Artaxo, coordenador do novo Centro de Estudos da Amazônia Sustentável

Como lembra Artaxo, a USP já tem uma forte agenda de pesquisas na região amazônica. Para ele, "a integração entre os muitos estudos e a colaboração com instituições amazônicas e com as iniciativas em curso são fundamentais para o desenvolvimento e aprimoramento de estratégias sustentáveis, que alterem o rumo do atual modelo de desenvolvimento 'predatório' ao ecossistema e não inclusivo às populações locais".

 Como vai funcionar o Ceas

O Ceas está vinculado diretamente à Reitoria da USP, e conta com a participação de pesquisadores do Instituto de Física, Instituto de Biociências, Instituto de Química, Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas, Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP em Piracicaba, da Faculdade de Direito, da Faculdade de Saúde Pública, dentre vários outros.

Segundo Artaxo, o Ceas tem atualmente cerca de 30 pesquisadores associados, de vários campi da USP, incluindo o campus da Cidade Universitária, Quadrilátero Saúde-Direito, Piracicaba, Ribeirão Preto e a EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades), localizada na zona leste de São Paulo. "São pesquisadores muito ativos, com diferentes formações e experiências acadêmicas na elaboração de uma agenda de pesquisa comum voltada à ciência para o desenvolvimento sustentável da região amazônica", afirma.

O Ceas também terá colaborações com instituições estrangeiras. Como diz o coordenador, "hoje é difícil fazer pesquisa de ponta sem fortes parcerias internacionais, e essas parcerias estão sendo estruturadas", citando o Instituto Max Planck, da Alemanha, o CNRS francês, a Universidade de Yale, em Connecticut, a Universidade de Berkeley, na Califórnia, a Michigan State University e Universidade de Lancaster, na Inglaterra, entre os que manifestaram interesse em colaborar nas pesquisas que o Ceas vai formar.

Estudos vão considerar as populações a partir de seus diferentes modos de vida e suas relações com a natureza. Foto: Arquivo/Agência Brasil

Linhas de pesquisa

A formação do Ceas é muito recente e, ao longo das próximas semanas, estará ocorrendo uma série de reuniões para definir a missão, o regimento e os projetos que serão desenvolvidos. "Estamos também estruturando o Conselho Diretor, que vai dar as direções estratégicas para o centro, e o Conselho Consultivo, que vai nos auxiliar a alcançar uma troca profícua de conhecimentos, aumentando o impacto de nossas pesquisas e ações", informa Gabriela.

Artaxo está otimista quanto ao início das atividades. "Esperamos que, em poucos meses, o centro esteja em pleno funcionamento, escrevendo propostas de pesquisa para grandes financiadores, de dentro e de fora do Brasil, e assim conseguir financiamentos e apoios para o desenvolvimento de nossas pesquisas e atividades", espera o coordenador, acrescentando que o Ceas terá uma sede física, com salas para receber pesquisadores e alunos da região amazônica, e contribuir para a integração das atividades.

"Já temos vários projetos temáticos financiados pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) que têm colaborações com o Ceas, mas queremos escrever propostas específicas e multidisciplinares nos próximos meses, para que o centro tenha recursos próprios para projetos de pesquisa dentro da nossa agenda de atuação para os próximos cinco anos", informa.

Políticas ambientais

O grupo de pesquisadores ligados ao Ceas tem feito, desde o início deste ano, contatos e reuniões para o delineamento das linhas estratégicas de pesquisa e das ações que devem ser fomentadas pelo centro. "Há um entendimento de que a Amazônia é, ao mesmo tempo, um laboratório potente para investigar as dinâmicas de políticas ambientais, para compreender as potências da multiplicidade de populações a partir de seus diferentes modos de vida e suas relações com a natureza, para avançar processos de descolonização e para desenvolver cadeias de valor e sociobiodiversidade que mudem as práticas e modelos econômicos atuais para um novo conjunto de iniciativas baseadas na floresta em pé", considera Gabriela.

Contudo, segundo a professora, é preciso avançar a produção de conhecimento técnico-científico e acelerar os esforços para enfrentar os desafios e complexidades amazônicos. A formulação de políticas públicas baseadas no conhecimento atual e a compreensão sobre os desafios e potencialidades nas interações entre ciência, política e sociedade são também tarefas do Ceas. Outras questões fundamentais que serão tema de estudos do centro incluem o desmatamento e seus efeitos na biodiversidade e na saúde (humana e das demais espécies) e seus impactos no ciclo hidrológico e no balanço de radiação; as relações entre saúde e trabalho considerando tanto as ocupações legais como as informais e as atividades ilegais.

Aspectos territoriais

A vice-coordenadora também menciona outros aspectos: as disputas e os conflitos relacionados a aspectos territoriais, ligados a questões fundiárias nos ambientes rurais e urbanos; os impactos da fragmentação do ecossistema, desmatamento e degradação florestal para a emissão de carbono pelo ecossistema. "Temos que desenvolver estratégias de pesquisas que levem em conta as vantagens estratégicas da região, bem como suas vulnerabilidades", ressalta.

Outras questões críticas que fazem parte da linha de atuação do Ceas incluem o desenvolvimento de um modelo econômico sustentável para a região amazônica que possa melhorar as condições de vida dos grupos sociais amazônicos; respeitando as diferentes abordagens dos grupos sociais amazônicos, o combate à insegurança alimentar e nutricional; a ampliação de ofertas de serviços essenciais como disponibilidade energética, e das condições de adaptação e resiliência dos territórios amazônicos, incluindo as cidades e seus processos de urbanização que seguem padrões desordenados, com precários serviços urbanos; e as condições de saneamento, que estão associadas à incidência de várias doenças.

"É importante, ainda, transformar conhecimento científico e tradicional em inovações sociais e tecnológicas que possam auxiliar na preservação do ecossistema e, ao mesmo tempo, reduzir as desigualdades socioeconômicas da região, promovendo inclusão social e desenvolvimento sustentável", 

salientam os coordenadores.
Pesquisas vão buscar entender funcionamento físico-químico e biológico da região amazônica. Foto: Vinícius Mendonça/Ibama – Flickr CC BY-SA 2.0

Interações complexas

Com uma atenção especial à inclusão, diversidade e equidade – elementos fundamentais para o desenvolvimento e prática da boa ciência –, o Ceas quer se estruturar também como um lócus de compartilhamento de conhecimentos e saberes (científicos, tradicionais, locais, práticos), propiciando fortemente as interações e colaborações com instituições e organizações que atuam na região amazônica. 

Há uma expectativa, ainda, de que o centro aproxime estudantes (de graduação e pós-graduação) e pesquisadores da USP na Amazônia, por meio de pesquisas e missões científicas. O Ceas também deverá centrar esforços para facilitar o acolhimento de estudantes da região amazônica nas atividades da USP.

"A Amazônia fornece oportunidades únicas em todas as áreas científicas, para ampliar nosso conhecimento sobre as complexas interações sociais com o meio ambiente. Temos muito a aprender com a região, e a ciência que o Ceas desenvolverá focará na preservação do ecossistema, bem como em encontrar caminhos para o desenvolvimento sustentável da Amazônia", finaliza Artaxo.

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal da USP

 

Comentários:


Estados da Amazônia Legal divulgam apenas 30% das informações ambientais

Estados da Amazônia disponibilizam em seus sites apenas 30% das informações sobre meio ambiente. Foto: Rodrigo Kugnharski/Unsplash

Entidades e órgãos dos nove Estados da Amazônia Legal disponibilizam em seus sites apenas 30% das informações necessárias para controle, regularização e tomada de decisões relacionadas ao meio ambiente. É o que diz o relatório "Transparência das informações ambientais na Amazônia Legal: a disponibilização dos dados públicos em 2022", do Instituto Centro de Vida (ICV).

O dado é referente à transparência ativa, que corresponde às informações disponibilizadas nas páginas das entidades. A pesquisa também contabilizou os dados de transparência passiva, a partir da solicitação de informações por meio dos Serviços de Informação ao Cidadão (e-SICs).

Os resultados são embasados por análises em sites de 28 órgãos estaduais e de 7 órgãos federais, de setembro e dezembro de 2022. Ainda, por 119 pedidos de acesso a informação, por meio dos sistemas eletrônicos, de janeiro a outubro de 2022.

De acordo com o analista socioambiental do ICV, Marcondes Coelho, aumentar a transparência das informações ambientais na Amazônia Legal possibilita um maior controle sobre atividades historicamente relacionadas à destruição da floresta.

"A falta de transparência dificulta a separação entre quem cumpre a legislação ambiental e a minoria que não a segue. É importante que as informações-chave para o controle ambiental estejam disponíveis de forma completa e em formato adequado para toda a sociedade, permitindo sua utilização no combate às práticas ilegais", 

disse.

Transparência ativa 

Dos nove Estados da Amazônia Legal, Mato Grosso possui o melhor índice de transparência ativa (53%), seguido do Pará (47%) e Rondônia (33%). O estado do Amazonas aparece na sequência, com um índice de 31%.

Os três primeiros estados possuem em comum páginas da internet dedicadas a portais da transparência específicos para informações ambientais. Os demais estados apresentaram índices abaixo de 21%, com o estado do Tocantins com o valor mais baixo (11%).

O relatório evidenciou que os órgãos estaduais apresentam níveis baixos de disponibilização e de qualidade das informações ambientais. Já os órgãos federais possuem um índice mais alto.

Estados da Amazônia disponibilizam em seus sites apenas 30% das informações sobre meio ambiente. Foto: Radek Grzybowski/Unsplash

Eixos temáticos 

O estudo também separou as informações de transparência ativa por eixos temáticos. Dentro disso, a regularização fundiária foi apontada como um gargalo a ser superado em todos os estados da Amazônia Legal. Isso porque a média de informações obtidas sobre o tema foi de apenas 15%.

"A ausência de informações nos sites dos órgãos de terras, sobretudo os estaduais, impossibilita o acompanhamento das políticas fundiárias pela sociedade, limitando o controle social, a cooperação entre os diferentes órgãos do Poder Executivo e a atuação das agências de controle",

diz trecho do documento.

Outro tema com baixa transparência foi o de regularização ambiental, que está relacionada às informações sobre implementação do Código Florestal e ações de comando e controle, como autorizações de supressão de vegetação nativa, autos de infração e embargos. Considerando os dados divulgados pelos estados e governo federal, a transparência nesse tema foi de apenas 28%.

"O Cadastro Ambiental Rural (CAR) é um dos principais instrumentos do Código Florestal, lei fundamental para conciliar a produção agropecuária com a conservação ambiental. O acesso aos dados completos do CAR possibilita o monitoramento e combate ao desmatamento nas diferentes cadeias produtivas, por outros atores além dos órgãos ambientais", comentou o Marcondes. 

Transparência passiva 

Apenas 46,2% dos pedidos de informação solicitadas aos órgãos de meio ambiente e institutos de terra de estados da Amazônia legal foram respondidos dentro do prazo estabelecido pela Lei de Acesso à Informação (LAI).

Entre os 119 pedidos de acesso a informação, 83 foram respondidos, mas apenas 55 enviaram a resposta antes do fim do prazo previsto. De acordo com a legislação, o órgão ou entidade tem o prazo de 20 dias para entrega do dado, com possibilidade de prorrogação por mais 10 dias, com justificativa expressa.

O Acre figura no último lugar no ranking de estados que responderam às solicitações de acesso a informação. De todos os pedidos feitos aos órgãos estaduais, nenhum foi respondido.

Em seguida, aparecem o Tocantins e o Amazonas, ambos com 27,3% dos pedidos respondidos. Respostas não coerentes ao que foi solicitado foram comuns para ambos os estados, justificando o baixo desempenho.

Mato Grosso respondeu a 28,6% dos pedidos de informação. Contudo, o órgão estadual que atua na regularização fundiária não respondeu nenhuma das solicitações dentro do prazo previsto.

"A falta de transparência sobre a gestão de terras compromete a participação da sociedade no ordenamento territorial, que é central para o estado que tem a produção agropecuária como base de sua economia", diz trecho do relatório.

Apesar disso, os órgãos federais tiveram destaque positivo. Todos os pedidos foram atendidos dentro do prazo previsto na legislação, com resposta coerente ao que foi solicitado. O estado de Rondônia, no mesmo sentido, teve resultado semelhante, com 87,5% de resposta aos questionamentos. 

Estados da Amazônia disponibilizam em seus sites apenas 30% das informações sobre meio ambiente. Foto: Dieny Portinanni/ Unsplash

Melhorias 

Marcondes pontuou que dar acesso às informações ambientais na Amazônia Legal é uma forma de promover uma ação coletiva de combate às práticas ilegais. Por isso, ele considerou essencial a ampliação da transparência sobre esses dados.

"É importante que os órgãos estaduais se engajem em ações de promoção da transparência de informações relevantes para a sociedade. Elaborar planos de dados abertos, a exemplo do governo federal, desenvolver portais de transparência ambiental ou disponibilizar bases de dados nos seus sítios eletrônicos, bem como estreitar o diálogo com os usuários de dados para identificar as melhorias necessárias, são alguns exemplos", finalizou.

Veja o relatório completo AQUI.

Página de impressão amigável Enviar esta história par aum amigo Criar um arquvo PDF do artigo
Publicidade Notícia