O Terminal Hidroviário de Porto Velho, popularmente conhecido como Cai N'água, continua sendo pauta de muita indignação por parte dos usuários e frequentadores desse espaço. Este Terminal Hidroviário foi inaugurado em julho de 2012 e sua construção foi fruto do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), sendo investidos na época cerca de R$ 13,9 milhões.
Naquela ocasião, foi firmado um convênio da Prefeitura de Porto Velho com o DNIT (Departamento de Nacional de Infraestrutura de Transportes) para execução da obra. Posteriormente, a Prefeitura de Porto Velho repassou o terminal para o Governo Federal por não ser atribuição da administração municipal gerenciar portos e hidrovias.
"O empreendimento irá beneficiar um grande fluxo de pessoas que utilizam o transporte hidroviário na região, representando um diferencial na vida dos ribeirinhos, já que os passageiros terão mais conforto. Antes da construção do terminal, os usuários da hidrovia precisavam descer e subir barrancos carregando bagagens. Também trará melhorias no escoamento de mercadorias e produtos para as comunidades ao longo do Rio Madeira, além de representar o incremento do turismo!"
DNIT em reportagem veiculada em 30/07/2012.
Dez anos se passaram e a vida da população ribeirinha não melhorou consideravelmente, pois os problemas históricos continuam fazendo parte desse viver amazônico, havendo a necessidade dos moradores continuarem descendo e subindo barrancos carregando bagagens nas costas e crianças pequenas nos colos. Não se pode negar que quando o Terminal está em operação, o escoamento da produção melhorou, mas quando fica paralisado as cenas do passado ressurgem nas imagens dos passageiros e trabalhadores dessa área.
Um outro problema nesse local, além da acessibilidade precária, é o acúmulo de toras e galhadas que acabam danificando a estrutura da Instalação Portuária de Pequeno Porte – IP4 em Porto Velho.
Terminal Hidroviário do Cai N’água em Porto Velho. Foto: ASCOM/DNIT/DAQ
O acúmulo das toras e galhadas estão relacionadas ao fenômeno das "Terras Caídas", apenas esse discurso é veiculado oficialmente pelo Poder Público. Mas, não se fala em ações de sustentabilidade junto às populações ribeirinhas para o aproveitamento dessas toras para ajudar na construção de escadas, bancos de madeira, flutuantes para melhor desembarque dos passageiros ao longo do Madeira e seus afluentes.
O passageiro idoso, com dificuldade de mobilidade, precisa transpor uma tábua de 30cm para chegar ao destino almejado, por exemplo, mostrando que ao longo dos anos ações voltadas para a melhoria da acessibilidade não chegaram no espaço ribeirinho.
Barrancos e falta de acessibilidade. Foto: Lucileyde Feitosa
Além disso, os troncos submersos são obstáculos à navegação, deixando a população usuária do transporte fluvial em estado permanente de alerta, medo e condição de vulnerabilidade. A correnteza forte do Madeira e os troncos são obstáculos que favorecem essa tensão, insegurança e medo para quem precisa descer o rio Madeira em alguma embarcação recreio.
Não há esforço coletivo dos órgãos governamentais para ajudar a população ribeirinha, no sentido da melhoria da acessibilidade e das condições de segurança das embarcações. Então, esses moradores vivem uma condição precária de cidadania que se perpetua ao longo dos anos.
Condições precárias destinadas aos passageiros no Cai N’água. Fonte: Lucileyde Feitosa
É uma realidade de invisibilidade social e política na região. Há anos essa população padece da falta de acessibilidade. Por que nas interdições do Terminal do Cai N'água não se pensa numa alternativa via Estrada de Ferro Madeira Mamoré? Por que a população usuária do transporte de passageiros e cargas continua descendo um barranco escorregadio no período chuvoso e íngreme no período da vazante?
As melhorias anunciadas na mídia ainda são insuficientes, considerando o drama vivido pela população ribeirinha de Porto Velho em não usufruir do seu direito constitucional de acessibilidade, de ir e vir com dignidade, segurança, sossego e conforto.
No dia 6 de julho de 2023, o DNIT informou a paralisação do Terminal do Cai N'água para receber serviços de melhorias, visando "a segurança da navegação e das operações portuárias, bem como a integridade física dos usuários".
Se formos observar ao longo das comunidades e cidades ribeirinhas localizadas à margem do rio Madeira, Porto Velho na condição de capital passa vergonha por ter um Terminal que vive mais em manutenção do que em funcionamento.
E os prazos para qualquer manutenção de alguma instalação é demorado, não restando outra alternativa ao passageiro de continuar descendo e subindo barrancos.
As pessoas com mobilidade reduzida, crianças e idosos, pessoas com deficiência sofrem demais numa realidade que era para ter um Terminal de referência, moderno, que orgulhasse a população de Rondônia, mas infelizmente essa realidade é distante pela falta de envolvimento político e planejamento correto por parte das autoridades responsáveis.
O Cai N'água é um espaço precário de cidadania decorrente do descaso político em Rondônia. Este Terminal já devia estar numa área mais ampla, segura e com melhores condições para atendimento da população ribeirinha, turistas e frequentadores desse espaço de grande movimentação e comunicação.
Que esta experiência de Olhar Amazônia com pertencimento possa ser multiplicada para a definição de campos possíveis de ação nas políticas públicas destinadas às populações tradicionais. Continue nos acompanhando e envie suas sugestões no e-mail: lucileydefeitosa@amazoniaribeirinha.com
Sobre a autora
Lucileyde Feitosa é professora, Pós-Doutora em Comunicação e Sociedade (Universidade do Minho/Portugal), Pós-Doutora em Geografia pela Universidade do Minho/Portugal, Doutora em Geografia/UFPR, Integrante do Movimento Jornalismo e Ciência na Amazônia e colunista do portalamaoznia.com.
*O conteúdo é de responsabilidade do colunista