Um grupo que reúne mais de 40 entidades de classe que se autodenominam "Coalizão em Defesa da Democracia" elaborou um manifesto dirigido ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra a nomeação do subprocurador-geral da República Paulo Gonet para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR). A possibilidade da indicação do atual vice-procurador-geral Eleitoral vem sendo apontada por interlocutores do presidente.
Entre as entidades que integram a "Coalizão em Defesa da Democracia" está o grupo jurídico Prerrogativas, que mantém proximidade com o governo Lula, a Associação Juízes e Juízas para a Democracia e o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). O documento, contudo, é assinado apenas por cinco delas: Associação Juízes e Juízas para a Democracia, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), o Coletivo por um Ministério Público Transformador (Transforma MP), Instituto de Pesquisa e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (Ipeatra) e Comissão Justiça e Paz de Brasília.
Após a publicação da reportagem, o coordenador do grupo Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, afirmou que a entidade respeita qualquer decisão que for tomada pelo presidente, "que recebeu a confiança do povo brasileiro para fazer suas indicações", embora respeite também o "direito de as pessoas de fazerem suas sugestões". Ele também afirmou que todos os cotados para o cargo têm o seu respeito.
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— Tenho respeito pelo Gonet, que é um grande jurista, muito preparado e muito íntegro. E vou apoiar a decisão do Presidente — disse Carvalho ao GLOBO.
Na carta, as entidades falam em "profunda preocupação com a possível indicação" em razão de posicionamentos adotados pelo subprocurador-geral ao longo de sua carreira. Ainda dizem que o temor se baseia no fato de o Brasil não estar "totalmente livres de possibilidades de golpes de Estado".
"Nessa conjuntura ainda instável e perturbadora, o papel do Procurador-Geral da República cresce em importância, diante da necessidade de que o Estado brasileiro - e não apenas o Governo Federal - mostre de forma induvidosa que ainda não desistiu da democracia. Ainda que o Ministério Público seja estruturado sobre os princípios da autonomia e independência de atuação, há um feixe de decisões que incumbem exclusivamente ao Procurador-Geral da República, o que dá o tom de sua participação na cena institucional do País", afirmam.
Apontam que durante os anos 1990, quando participou de julgamentos na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, como representante do Ministério Público Federal, votou contra o reconhecimento da responsabilidade do Estado em casos de grande repercussão, como o da estilista Zuzu Angel.
Mencionam ainda um suposto apoio da deputada bolsonarista Bia Kicis (PL-DF) à indicação de Gonet ainda em 2019, quando o então presidente Jair Bolsonaro (PL) avaliava nomes para comandar a PGR. Gonet foi colega de turma de Kicis na graduação em direito na Universidade de Brasília (UnB).
"O problema de um ultraconservador na PGR ocorre quando religião e direito misturam-se, perturbando a aplicação do princípio da laicidade do Estado. O ultraconservadorismo de direita fundamenta-se exatamente nessa confusão entre valores religiosos e aplicação do direito", dizem os signatários do texto. O membro da PGR se identifica como muito religioso, e é adepto do catolicismo.
A divulgação do manifesto gerou uma contraofensiva, e entusiastas da candidatura de Gonet argumentam que as tentativas de desabonar o subprocurador se valem de fatos pretéritos. Lembram, ainda, que no TSE suas manifestações desfavoráveis a Bolsonaro foram acompanhadas integralmente pelos ministros na Corte.
Nas últimas semanas, a disputa pelo comando da Procuradoria-Geral da República havia se afunilado entre Gonet, que tem o apoio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, e de Antônio Carlos Bigonha, que também é subprocurador-geral e era respaldado por alas do PT e integrantes do entorno de Lula.
Gonet, de 62 anos, ocupa atualmente o posto de vice-procurador-geral Eleitoral, e atuou durante as eleições de 2022. Além disso, foi o responsável por pareceres favoráveis à inelegibilidade de Bolsonaro em julgamentos no TSE.
O mandato de Augusto Aras à frente da PGR terminou em 26 de setembro sem que o nome do novo chefe do órgão ainda estivesse indefinido. Por isso, ocupa a função de forma interina a subprocuradora-geral da República Elizeta Ramos, que tem atuação elogiada do STF e vem adotando posicionamentos alinhados a uma agenda do governo petista, além de manter um foco em ações de combate à desigualdade de gênero.
Fonte: O Globo