Regionais : O quebra-cabeças da carreira da saúde e seu reflexo no SUS
Enviado por alexandre em 26/03/2024 20:53:56

União, estados e municípios. Efetivos, temporários e terceirizados. O serviço público na saúde exige que a gestão considere múltiplas variáveis, muitas delas associadas aos problemas no atendimento à população. Nesta edição da newsletter Por Dentro da Máquina, contamos um pouco desse universo e falamos da carreira que atua nos hospitais federais do Rio de Janeiro — e de uma possível nova carreira no âmbito do SUS. Nesta edição, a gente trata também do uso das ciências comportamentais no serviço público e da proposta para que os servidores possam atuar como microempreendedores. Boa Leitura! 

Recebeu de um amigo? Assine a newsletter gratuitamente

O quebra-cabeças da carreira da saúde e seu reflexo no SUS

© Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil Política Brasília, 14/07/2023 O ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, posa para foto com o personagem Zé Gotinha durante sanção da lei do Mais Médicos. Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Hospital Cardoso Fontes é uma das 6 unidades federais em funcionamento no Rio de Janeiro / Crédito: Fernando Frazão/Agência Brasil 

A crise na gestão dos hospitais federais do Rio de Janeiro abre caminho para a análise de uma numerosa carreira do serviço público federal. A maioria dos servidores agrupados na Carreira da Previdência, da Saúde, e do Trabalho (CPST) atua nessas unidades.

Ao todo, o Ministério da Saúde tem 201.848 vínculos de servidores, dos quais apenas 55.540 (27,5%) estão em exercício, contra 146,3 mil de aposentados e pensionistas. A título de comparação, no Ministério da Defesa, com 800 mil vínculos, 43,9% estão em exercício.

Desses mais de 55 mil servidores da Saúde, quase 29 mil pertencem à carreira dos PST, sendo que a maior parte está nas unidades de média e alta complexidade administradas pela União, formada por seis hospitais e três institutos federais.

Essa carreira, no entanto, está em processo de extinção, uma vez que o Sistema Único de Saúde funciona de forma descentralizada e remete aos estados e municípios o atendimento à população.

Em seu lugar, há anos se discute a criação de uma carreira no âmbito do SUS, que nunca saiu do papel.

Enquanto isso, esses servidores relatam, governo após governo, uma rotina de descuido e ingerência política nas unidades hospitalares, que, de tempos em tempos, aparece por meio de denúncias de irregularidades, como as que foram apresentadas, este mês, em reportagem do Fantástico, da TV Globo.

"Da mesma forma que os hospitais, os servidores da rede federal não têm recebido a atenção necessária. Eles poderiam prestar um importante serviço em um segmento crítico, que é o de média e alta complexidade. A questão é de salários e de condições de trabalho", avalia o coordenador-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social, Sandro Cezar.

Um pesquisador vinculado ao Ministério da Saúde reconheceu, sob a condição do anonimato, os problemas na gestão de pessoas dos hospitais federais.

Um deles é a situação mal resolvida dos servidores, dos terceirizados e dos vínculos temporários, que são corriqueiros e têm prazo determinado de dois anos, o que afeta a continuidade das atividades.

No dia 13 de março, por exemplo, o Ministério da Saúde abriu processo seletivo simplificado com 1.889 vagas temporárias de nível médio e superior nos hospitais federais, sendo 479 de ocupação imediata e outras 1.410 para a formação de cadastro de reserva.

O pesquisador do SUS pondera que é preciso modernizar a força de trabalho, com o uso de contratos típicos da CLT, que seriam importantes no setor. Ele afirma, porém, que esse processo deveria ocorrer de forma organizada e, principalmente, com o controle efetivo do Estado sobre o serviço prestado à sociedade.

A "extinção" dos PSTs expõe situações curiosas. De acordo com o Painel Estatístico de Pessoal (PEP), a idade média dos médicos vinculados à administração federal é de 73,14 anos. Essa conta exclui os profissionais contratados no programa Mais Médicos.

Os representantes da carreira de PST estão em negociação com o governo desde o início do segundo semestre de 2023, por meio da Mesa Específica e Temporária. Entre as principais reivindicações está a correção de distorções na tabela de remuneração frente aos salários pagos na carreira de Seguridade Social e a recomposição da gratificação de desempenho dos médicos.

Em paralelo aos temas da carreira dos PST, o Ministério da Saúde discute a possibilidade de passar a administração dos hospitais federais à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), estatal vinculada ao Ministério da Educação.

Os representantes da carreira de PST se opõem a essa mudança.

"Da mesma forma que os hospitais, os servidores da rede federal não têm recebido a atenção necessária. Eles poderiam prestar um importante serviço. A questão é de salários e de condições de trabalho."

- Sandro Cezar, coordenador-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS)

 

A nova chance para a criação da carreira do SUS

À medida que a carreira da Previdência, da Saúde e do Trabalho (PST) perde força na administração federal, ganha espaço um debate maior, que envolve a criação de uma carreira no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

Essa carreira levaria em conta a natureza tripartite (União, estados e municípios) do SUS e as peculiaridades típicas das contratações na prestação de serviços públicos na saúde.

A discussão da carreira do SUS já acontece há mais de 30 anos, mas, dada sua complexidade e as diferentes visões sobre o tema, ainda não se materializou. São cerca de 3 milhões de pessoas que atuam no SUS, considerando os diferentes vínculos nos três níveis de governo.

No segundo semestre de 2023, porém, o Ministério da Saúde retomou o assunto na Mesa Nacional de Negociação Permanente do SUS e no Programa de Valorização da Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Valoriza GTES-SUS.

Este programa criou uma comissão para discutir e elaborar a Proposta de Carreira no Âmbito do Sistema Único de Saúde (CDEPCA/SUS). A comissão deve "fomentar espaço de debate, estudos, pesquisas, diagnósticos a fim de apoiar Estados, Distrito Federal e Municípios acerca do aprimoramento das carreiras no âmbito do SUS".

O Valoriza GTES-SUS também instituiu uma comissão para tratar do planejamento e do dimensionamento da força de trabalho no Sistema Único de Saúde. Outra comissão trata do Programa Nacional de Atenção Integral à Saúde e Segurança do Trabalhador e da Trabalhadora do SUS.

Em setembro do ano passado, o tema foi discutido em reunião da Mesa Nacional, e os especialistas alertaram como principais desafios a "remuneração adequada e oportunidades de crescimento na carreira", bem como a "multiplicidade de vínculos dos trabalhadores na saúde".

Na ocasião, a professora Maria Helena Machado, da Fiocruz, afirmou que a carreira do SUS precisa estar na agenda não só para valorizar os servidores, mas também para garantir à população "trabalhadores comprometidos e dedicados ao Sistema de Saúde”.

Na última quinta-feira (21/3), a newsletter Por Dentro da Máquina encaminhou um questionário ao Ministério da Saúde, com perguntas sobre o diagnóstico que leva à necessidade da criação de uma carreira do SUS; de que forma as comissões podem auxiliar a melhorar a situação de servidores e cidadãos; e quais são os pontos de partida para a criação da carreira e para a execução do dimensionamento da força de trabalho.

O Ministério da Saúde, porém, não havia respondido até o fechamento desta edição.


Mais sobre o Executivo

 

Autonomia do Banco Central: funcionários se posicionam

As carreiras que atuam no Banco Central avaliam a polêmica PEC 65, que trata da autonomia financeira da instituição. Enquanto os especialistas realizam consulta ao longo dos próximos dias, os procuradores já se manifestaram contrariamente ao texto defendido pela direção do BC.

As três entidades que representam analistas e técnicos do Banco Central (Sinal, SinTBacen e ANBCB) realizarão assembleia deliberativa, com votação eletrônica, a partir desta terça-feira (26/3) até o dia 2 de abril.

O comando de duas delas, SINAL e SinTBacen, já se manifestou, com indicativo de rejeição ao texto original da PEC 65.

Porém, o tema divide os funcionários do BC, o que fica evidenciado pelo placar da votação entre os conselheiros do Sinal, com 9 votos contrários ao texto original e 8 favoráveis.

Vale notar que todas as entidades sinalizam abertura à negociação dos termos da proposta, apresentada pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO) com o apoio do presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Já os procuradores, representados pela Associação dos Advogados Públicos Federais (Anafe), tiraram uma posição forte contra o texto em tramitação no Congresso.

A Anafe divulgou nota, na qual apresenta uma lista de objeções à proposta, após a realização de pesquisa com funcionários da ativa e aposentados.

De acordo com a Anafe, a transformação do Banco Central em empresa pública ameaça as prerrogativas dos procuradores e não se reverte em benefícios para esses funcionários.

“De início não se vislumbra a possibilidade de pagamento de participação nos lucros e resultados (PLR), já que o BC EP (Banco Central Empresa Pública) executará atividade típica de Estado, que não tem por escopo a aferição de lucro”, avaliou a coordenadora de carreira de Procuradores do BC da Anafe, Conceição Maria Silva, em nota divulgada pela associação.

A diretora da associação também pondera que o regime de trabalho passaria a ser celetista, portanto, sem estabilidade de emprego.

A Anafe afirma ainda que a autonomia financeira do BC faria com que os funcionários não ficassem submetidos ao teto constitucional, "sob pena de se criar paradigma a ser perseguido pelos servidores públicos de diversos outros órgãos estatais que não gozam de tal privilégio".

A PEC 65, que transforma a autarquia em empresa pública, aguarda votação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e é relatada pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM).

 

Ciências comportamentais na gestão pública

Fenômeno recente na administração pública brasileira, o uso das ciências comportamentais pelos gestores já norteia decisões que auxiliam no esforço de aumentar a efetividade do Estado.

Essa inovação utiliza conhecimento de diferentes áreas, como economia e psicologia cognitiva, atrelado ao comportamento humano, para a resolução de problemas.

No final de 2023, a OCDE publicou artigo em que relata os resultados de uma auditoria anti-sludge, que usa as ciências comportamentais para desfazer barreiras ocultas nas interações entre governo e sociedade, para compreender a razão pela qual milhares de brasileiros deixavam de recuperar suas contas no GOV.BR.

Apesar do GOV.BR permitir o acesso a cerca de 4.800 serviços digitais do governo federal, os usuários desistiam de recuperar a conta porque, ao final do processo, eram informados de que a recuperação da conta levaria até 48 horas, sendo que os dados são validados em 30 minutos.

A partir dessa constatação, os técnicos que atuam no sistema passaram a desenvolver intervenções no processo de recuperação de conta para implementar uma solução que reduza a frustração do usuário.

Esse trabalho tem sido desenvolvido pela unidade de ciências comportamentais em governo, batizada de Cinco, que é vinculada ao Ministério da Gestão e da Inovação.

Neste mês, o processo ganhou escala, com a publicação de uma Carta de Serviços, com 6 formatos para difundir conteúdo sobre o uso das ciências comportamentais na administração federal.

A primeira etapa começa nesta semana, com a Jornada de Investigação de Problemas Comportamentais em Políticas Públicas, cujo período de inscrições terminou na segunda-feira (25/3).

O programa prevê palestras, mentorias, projetos e ferramentas para o uso dessa inovação para a resolução de problemas.

Conheça a carta de serviços do CINCO e como as ciências comportamentais podem ser utilizadas no trabalho do gestor público.

 

 

Legislativo

 

Servidor público e MEI: proposta avança no Senado

A Comissão de Assuntos Econômicos do Senado aprovou, no último dia 19, a proposta que permite que servidores públicos federais possam desenvolver atividades como microempreendedor individual (MEI). O projeto altera o artigo 117 do Regime Jurídico dos Servidores Públicos.

De acordo com a proposta, apresentada pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS), essa possibilidade segue vedada para ocupante de cargo em comissão, "devendo, ainda, ser observada eventual legislação sobre conflito de interesses".

Na avaliação do relator, a atuação de servidores públicos como MEI não impacta negativamente a administração pública, uma vez que há diversas hipóteses em que os servidores ocupam dois cargos na administração ou atuam de forma paralela na iniciativa privada.

Assim, afirma Trad, seria "incoerente admitir a acumulação de cargos públicos ou a atuação paralela em um emprego privado, porém não permitir que o servidor possa atuar por conta própria como microempreendedor, desempenhando uma atividade econômica em escala reduzida, com receita limitada a R$ 81.000,00 ao ano".

Em 2019, a Controladoria-Geral da União publicou o Enunciado 26, que veda a "atuação do servidor público federal como empresário individual".

O projeto segue para análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, em caráter terminativo. A proposta ainda precisa ser aprovada pela Câmara dos Deputados.

 

Câmara divulga aprovados em concurso

A Câmara dos Deputados publicou, na última quinta-feira (21/3), os resultados definitivos das provas discursivas do concurso para Analista Legislativo, nas atribuições Contador, Informática Legislativa, Técnico em Material e Patrimônio, Assistente Social, Enfermeiro, Farmacêutico e Médico.

Os candidatos inscritos para vagas destinadas para pessoas negras e pessoas com deficiência já foram convocadas para o procedimento de heteroidentificação, marcado para o próximo dia 7 de abril. O concurso da Câmara abriu 140 vagas de analista legislativo.

De acordo com a Câmara, os aprovados para o cargo de médico deverão enviar os seus títulos para a Fundação Getulio Vargas até esta quinta-feira (28/3). Confira aqui os resultados. 


Judiciário

 

Conselho da Justiça do Trabalho é regulamentado

O presidente Lula sancionou a Lei 14.824, que regulamenta o funcionamento do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. A lei trata da composição, do funcionamento e das competências do CSJT.

O projeto, apresentado pelo Tribunal Superior do Trabalho, foi aprovado, em fevereiro, no plenário do Senado.

A lei é importante porque, embora o CSJT já desempenhe suas funções, faltava regulamentar as atividades do conselho, com normativo próprio, de acordo com a Reforma do Judiciário, aprovada há 20 anos.

“Essa lei constitui um avanço institucional muito importante e valoriza a atuação do conselho como órgão máximo, tanto na supervisão administrativa, quanto disciplinar, da magistratura trabalhista”, afirmou o presidente do Tribunal Superior do Trabalho e do CSJT, ministro Lelio Bentes Corrêa.

O CSJT entrou em funcionamento em junho de 2005. Com a regulamentação, o conselho da Justiça do Trabalho fica no mesmo status do Conselho da Justiça Federal, cujas atividades foram regulamentadas em 2008.

 

Isonomia em cotas do Judiciário

O Conselho Nacional de Justiça aprovou novas regras para o ingresso de candidatos indígenas e com deficiência nos concursos públicos para servidores do Judiciário.

Esses candidatos estarão sujeitos às mesmas normas já em vigor para pessoas negras, com exigência de notas 20% menores na comparação com os participantes na ampla concorrência.

A decisão foi aprovada por unanimidade e tem por objetivo assegurar isonomia das ações afirmativas para candidatos negros, indígenas e com deficiência.

“Considerando a essência das políticas afirmativas de inclusão adotas pelo CNJ para ingresso nos cargos efetivos de servidores, a mesma disposição quanto à nota mínima aplicável aos candidatos negros deve ser estendida aos candidatos indígenas e àqueles com deficiência, seja por incidência do princípio da isonomia, seja por coerência da própria ação afirmativa empreendida pelo CNJ”, afirmou o presidente do CNJ, Luís Roberto Barroso em seu voto.

A resolução 512/2023, do CNJ, prevê que, pelo menos, 3% dos novos cargos efetivos na Justiça sejam preenchidos por candidatos indígenas.

 

Nomeações e remoções

  • Helvécio Miranda Magalhães Júnior foi exonerado do cargo de Secretário de Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde, em 19 de março. No mesmo ato, Alexandre Oliveira Telles foi exonerado do cargo de diretor do Departamento de Gestão Hospitalar no Rio de Janeiro. No dia 25Mirena Silva foi exonerada da coordenação-geral de Governança Hospitalar do Departamento de Gestão Hospitalar do Rio de Janeiro.
  • Na Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Lucas Monteiro Costa Dias assume a chefia de gabinete do ministro Paulo Pimenta; Marcelo Eibs Cafrune assume a chefia de gabinete da Secretaria-Executiva; Brunna Rosa Alfaia foi nomeada secretária de Estratégia e Redes da Secom; Maria América Menezes Bonfim Hamú foi designada diretora de Articulação Institucional; Gessica Fernanda Daniel Santos assume como diretora de Pesquisa e Análise Estratégica e Redes; Fábio Meirelles Hardman de Castro foi nomeado Diretor do Departamento de Direitos na Rede e Educação Midiática, em 21 de março
  • Lucas Freire Silva foi dispensado, a pedido, da diretoria de Pesquisas e Informações Estratégicas da Controladoria-Geral da União, em 20 de março;
  • Camila Kühl Pintarelli foi nomeada diretora de Gestão do Fundo Nacional de Segurança Pública, no Ministério da Justiça e Segurança, em 19 de março;
  • Karina Nathércia Sousa Lopes foi designada Procuradora Nacional de Defesa da Democracia da Advocacia-Geral da União, em 22 de março;
  • José de Arimatéia Araújo foi exonerado da diretoria de Operações, Engenharia e Tecnologia da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em 25 de março. Bráulio Costa Ribeiro assume a função.

(Com Rafaela Dias)


Roberto Maltchik
Editor

Página de impressão amigável Enviar esta história par aum amigo Criar um arquvo PDF do artigo
Publicidade Notícia