Justiça : “A mesma droga é tratada como consumo em bairro rico e como tráfico na periferia”, diz Barroso
Enviado por alexandre em 21/06/2024 10:05:53


O ministro Luis Roberto Barroso, do STF. Foto: reprodução

O ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou durante a sessão sobre a descriminalização do porte de maconha na última quinta-feira (21) que a mesma quantidade de drogas é tratada como consumo em bairros ricos e como tráfico na periferia.

O STF está julgando a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, que considera crime o porte de drogas para uso pessoal e prevê medidas alternativas de punição, como a prestação de serviços à comunidade. O julgamento começou em 2015 e já foi suspenso quatro vezes devido a pedidos de vista.

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Barroso, que é presidente do STF, abriu a sessão explicando o caso e destacou que a falta de uma legislação clara causa desigualdade na abordagem de quem porta drogas.

“Segunda questão é qual a quantidade que diferencia porte para consumo pessoal de tráfico. E a razão para fazermos isso é a necessidade de criarmos um critério objetivo, porque na falta de critério, a mesma quantidade de drogas nos bairros mais elegantes das cidades brasileiras é tratada como consumo e na periferia é tratada como tráfico”, disse Barroso.

“O que nos queremos é acabar com essa discriminação entre ricos e pobres, basicamente entre brancos e negro”, completou.

Os ministros Alexandre de Moraes, Kassio Nunes Marques e Luiz Fux também se manifestaram. O debate entre os magistrados durou mais de 40 minutos, até que Dias Toffoli apresentou uma nova interpretação sobre a lei contestada. O julgamento foi suspenso e será retomado na próxima terça-feira.

Até agora, cinco ministros votaram a favor da descriminalização do porte de drogas: Gilmar Mendes, Edson Fachin, Barroso, Moraes e Rosa Weber (quando ainda era ministra). Três votaram contra a descriminalização: Cristiano Zanin, André Mendonça e Nunes Marques. Ainda faltam os votos de Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Luiz Fux.

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Jovem negro usando droga sentado na rua. Foto: reprodução

Uma pesquisa realizada pelo Centro de Estudos Raciais do Insper revelou que, em São Paulo, 31 mil pessoas pardas e pretas foram enquadradas como traficantes em situações similares às de brancos que foram tratados apenas como usuários.

Indivíduos enquadrados por tráfico de drogas são autuados em flagrante e permanecem detidos até a audiência de custódia, onde a Justiça decide se continuarão presos ou se serão libertados. Nos casos de porte para consumo próprio, os acusados enfrentam penas alternativas.

O estudo, conduzido pelo pesquisador Daniel Duque, analisou 3,5 milhões de boletins de ocorrência registrados pela polícia de São Paulo entre 2010 e 2020. Duque constatou que a probabilidade de uma pessoa preta ou parda ser enquadrada como traficante é 1,5% maior do que a de uma pessoa branca.

Para evidenciar o impacto do racismo nas decisões policiais, Duque comparou casos com detidos do mesmo gênero, grau de instrução e quantidade da mesma droga.

A pesquisa destaca que o componente racial é mais evidente em casos de pequenas quantidades de drogas leves, como a maconha, sendo ainda mais acentuado em situações envolvendo substâncias sintéticas e lisérgicas. Em casos de grandes quantidades de drogas, como crack e cocaína, a classificação tende a ser mais uniforme.

Qual a diferença de “usuário” e “traficante”?
Cigarro de maconha. Foto: reprodução

Além do fator racial, o grau de instrução também influencia as decisões policiais. Indivíduos com ensino médio completo ou nível superior são mais frequentemente tratados como usuários, enquanto aqueles com menor grau de instrução são classificados como traficantes, mesmo em circunstâncias semelhantes.

Os dados também indicam que, em áreas com maior proporção de negros na população, a diferença no enquadramento tende a ser menor. Durante o período analisado, cerca de 80% das apreensões de drogas resultaram em autuações por tráfico, com um aumento para 84,3% em 2020.

O número de pessoas pretas envolvidas nas ocorrências manteve-se estável em aproximadamente 7%, enquanto a participação de brancos caiu de 64,7% para 58,3%, e a de pardos aumentou de 28% para 34,5%.

Em relação às substâncias apreendidas, a maconha foi encontrada em 65,2% dos casos de consumo e 36,3% dos de tráfico. A cocaína e o crack foram responsáveis por, respectivamente, 22,3% e 10,9% dos casos de consumo, e 37% e 24,1% dos de tráfico. Substâncias sintéticas e lisérgicas representaram 1,5% dos casos de consumo e 2,6% dos de tráfico.

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