Regionais : 'Produtor rural não pode ser considerado vilão’
Enviado por alexandre em 10/07/2010 17:46:04



'Produtor rural não pode ser considerado vilão’

Moreira Mendes, presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, quer mudar a visão de que agricultores são os responsáveis por devastação ambiental. Ele, porém, trabalha para flexibilizar ainda mais novo Código Florestal



Presidente da Frente da Agropecuária, Moreira Mendes trabalhará para fazer novas mudanças no Código Florestal
Renata Camargo

Pecuarista e advogado, o deputado Moreira Mendes (PPS-RO) é o novo presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária – grupo que defende os interesses do setor rural produtivo brasileiro no Congresso. Membro da bancada ruralista, o parlamentar afirma que a prioridade número um de sua gestão será modificar a legislação ambiental, afim de regularizar a situação no campo e resgatar a imagem do produtor rural. Para ele, avanços já foram obtidos com a aprovação, na Comissão Especial, do relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para o novo Código Florestal. Mas Moreira Mendes quer mais. O desafio que ele se impõe é conseguir incluir, na tramitação até o Código chegar ao plenário, outros dispositivos que ficaram fora do relatório de Aldo.

Certamente, o trabalho de Moreira Mendes provocará polêmica. O deputado assume a frente num contexto em que agricultores e pecuaristas têm sido vistos como os grandes “vilões” ambientais no Brasil. O desmatamento é responsável por 75% da emissão de gases poluentes no país. Mas Moreira Mendes afirma que o produtor não deve ser visto sob esse “conceito errado” e, por isso, defende uma mudança profunda no Código Florestal.

Entre outras alterações, ele defende que seja repassada aos estados a prerrogativa de legislar a respeito dos limites da reserva legal e de áreas de preservação permanente (APPs). Isso, na prática, deve permitir que estados e municípios reduzam as áreas obrigatórias de preservação. Hoje, em Rondônia, por exemplo, um produtor rural deve preservar 80% de sua propriedade. Ele propõe ainda que as áreas agrícolas já consolidadas – mesmo as que hoje estejam em situação ilegal, segundo a legislação ambiental – sejam regularizadas.

“Não tem sentido gastar dinheiro e energia para recuperar alguma coisa que já está explorada. O que você vai fazer com a uva produzida no Rio Grande Sul? Com o café em Minas Gerais? Ambos estão em topo de morro. Essas decisões ambientais precisam ser tomadas sempre embasadas em critérios técnico-científicos. Tem que se acabar com esses aloprados que ficam achando isso e aquilo”, considerou.

Nascido em São Paulo, Moreira Mendes foi para Rondônia em fevereiro de 1971 em busca de oportunidades. No estado, na floresta Amazônica, o paulista pôde se dedicar à produção agropecuária e hoje ao turismo no meio rural. Além de deputado federal, Moreira Mendes já foi procurador da Assembleia Legislativa do estado, secretário de estado da Administração do governo rondoniense de 1991 a 1993 e senador por Rondônia de 1999 a 2002, quando assumiu como suplente de José Bianco, que na época foi eleito governador do estado.

O deputado começou a carreira política filiado à extinto Arena (Aliança Renovadora Nacional), partido criado para dar sustentação ao governo militar a partir durante a ditadura. Passou também pelo PDT e pelo antigo PFL (hoje DEM), antes de se filiar ao PPS. Em relação a temas polêmicos como reforma agrária, Moreira Mendes tem pensamento afinado com os que defendem maior controle sobre os movimentos sociais. Ele se diz a favor da reforma agrária, mas condena a invasão de terras e afirma que os movimentos sociais “querem inviabilizar a propriedade privada”.

“Movimento social nenhum está acima das leis. Não é possível a gente compactuar com a anarquia, com a baderna, com a invasão, com o quebra-quebra, com o dano. Acho legítimo qualquer movimento fazer as suas reivindicações, desde que seja nos limites da lei. Na verdade, o que esses movimentos querem é inviabilizar a propriedade privada, inviabilizar a produção rural”, diz.

Na entrevista concedida ao Congresso em Foco, Moreira Mendes defende ainda que não há diferença entre o pequeno e o grande produtor rural. O novo presidente da Frente Agropecuária critica a existência de dois ministérios para tratar dos interesses do setor agrícola – Ministério do Desenvolvimento Agrário e Ministério da Agricultura.

Leia abaixo a entrevista:

Congresso em Foco - Quais serão as prioridades de sua gestão como presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária?
Moreira Mendes - A primeira delas é continuar o trabalho da gestão anterior no sentido de promover a mudança na legislação ambiental, de forma a compatibilizar os interesses da preservação e conservação do meio ambiente com os interesses da produção. Esse é o principal desafio da frente parlamentar. Outro desafio – proposta minha que julgo extremamente importante – é a gente desmistificar um pouco esse conceito errado que se faz do produtor rural. Ele tem sido visto como vilão de todo esse passivo ambiental, que é debitado quase que exclusivamente ao produtor rural. Quando a sociedade, sobretudo nas grandes cidades, se refere ao produtor rural, ao fazendeiro, ao agronegócio, fazem até com um tom debochado, em tom pejorativo. O Brasil precisa entender a importância desse setor. Quase 37% de todos os empregos do país vêm do campo. O Brasil saiu quase ileso da crise econômica mundial muito por conta da produção rural, do agronegócio brasileiro.

Quais outros aspectos o senhor pretende trabalhar com a frente?
Um ponto muito importante é sensibilizar o governo federal da responsabilidade que ele tem com a questão da infraestrutura do país. O problema das estradas, dos portos, dos sistemas de transporte, de infraestrutura, enfim, é um grande gargalo hoje da produção. Esse problema é sério. E nós entendemos que o governo não tem investido o que deveria investir. Para se ter uma ideia, do preço total da soja hoje no Mato Grosso, 50% é do frete que vai do centro de produção para os portos. Isso é uma coisa absurda. O custo com frete aumenta em muito os preços. E isso minimizaria com a construção de boas estradas, de ferrovias e melhorias, até mesmo nos aeroportos. Outro ponto, que é uma vigilância constante da frente, é estar atento a essas questões de política agrícola, como a questão do crédito e do seguro da produção, que já avançamos, mas precisamos avançar mais.

Em relação às mudanças na legislação ambiental, o que é preciso alterar?
Primeiro, precisamos separar o que compete à União, aos estados e aos municípios. Hoje há uma confusão generalizada. Não se sabe o que é competência de um e de outro e acaba que a União monopoliza tudo com o Conama, legislando no lugar do Legislativo. Acho que tem que haver uma divisão clara de poder, pois isso gera uma insegurança jurídica no campo muito grande. É preciso transferir para os estados uma parte dessa responsabilidade. Deixar que a União legisle as regras básicas e os estados partam para o detalhamento. Por que a União tem que dizer qual é a largura de área de preservação nas margens dos rios? Por que um rio em Rondônia e um rio em São Paulo têm que ter a mesma margem? Um segundo ponto é a consolidação das áreas. Essa tal de reserva legal é uma coisa muito complicada, na minha visão é uma expropriação. Ela devia acabar. Não tem sentido gastar dinheiro e energia para recuperar alguma coisa que já está explorada. O que você vai fazer com a uva produzida no Rio Grande Sul? Com o café em Minas Gerais? Ambos estão em topo de morro. Essas decisões ambientais precisam ser tomadas sempre embasadas em critérios técnico-científicos. Tem que se acabar com esses aloprados que ficam achando isso e aquilo.

A agricultura hoje é dividida em familiar e patronal. O senhor avalia que pequenos e grandes devem ter a mesma pauta de reivindicação, ou se trata de dois segmentos diferentes?
Não são diferentes, absolutamente. Um é complementar ao outro. Acho que, inclusive, houve um erro no passado ao se dividir a pequena e a grande agricultura. Acho que o Brasil deve ser o único lugar do mundo com dois ministérios cuidando da mesma coisa, o Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Quer falar de reforma agrária? Então vamos falar só da reforma agrária. Mas deixa o problema da agricultura e da pecuária, seja da grande empresa ou da agricultura familiar, tudo no mesmo barco. O atual governo acentuou ainda mais essa separação. É como se um fosse o rico e o outro o pobre, ou um tivesse mais e outro menos. Nós temos que acabar com essa discriminação. Tem que haver apenas um ministério, com políticas diferentes incentivando mais quem precisa mais, mas apenas um ministério. Dois ministérios é só para criar a cizânia. Aliás, esse governo primou muito por essa defesa exacerbada dos movimentos sociais. A frente vai tratar tanto da agricultura familiar quanto da outra agricultura da mesma forma.

O que o senhor pensa em relação à reforma agrária e a criminalização de movimentos sociais como o Movimento dos Sem-Terra (MST)?
Acho absolutamente correto criminalizar quem invade terra produtiva, quem faz baderna. Até porque neste país ninguém está acima da lei. Todos têm que estar subjugados à Constituição e às leis. Movimento social nenhum está acima das leis. Não é possível a gente compactuar com a anarquia, com a baderna, com a invasão, com o quebra-quebra, com o dano. Não sou contra a reforma agrária. O Brasil precisa enfrentar a reforma agrária. Acho legítimo qualquer movimento, de qualquer bandeira, de qualquer posicionamento político, fazer as suas reivindicações, desde que seja nos limites da lei. Mas, na verdade, o que esses movimentos querem é inviabilizar a propriedade privada, inviabilizar a produção rural. No fundo, eles querem gerar essa instabilidade. São absurdos que não podem continuar acontecendo. O governo tem sido absolutamente omisso nessa questão. Ou pior, financia por vias transversas, dando dinheiro a organizações não-governamentais que estimulam esses movimentos. Todas as tentativas do Congresso Nacional de apurar as responsabilidades por meio de CPI têm sempre o pano quente do governo por cima, usando sua bancada para não permitir que as investigações sejam feitas. Isso é absurdo.

O senhor falou que o produtor rural tem sido visto como vilão. O que pode ser feito para recuperar a imagem da categoria?
Todo dia, a grande mídia se refere ao produtor rural como vilão. Há um maniqueísmo nessa história, como se a gente fosse do mal e os outros do bem. As coisas não são assim. A gente tem que entender a importância histórica do setor. A frente pode recuperar a imagem do produtor rural mostrando a realidade, assim como tem feito com brilhantismo a senadora Kátia Abreu e tantos outros parlamentares.

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