Religião e política são dois assuntos que polêmica. Quando os dois universos se juntam, as discussões podem ser ainda mais intensificadas. Entretanto, existe uma grande participação de pessoas atreladas à religião, especialmente, evangélicos na vida política do país.
A princípio, não há problemas em pessoas religiosas se envolverem na política, desde que haja o respeito ao estado democrético de direito e às leis vigentes. Além disso, deve-se respeitar a laicidade do Estado e não impor ou transferir para o governo ideais e valores que são particulares, como os da vida religiosa.
Quer saber mais sobre a relação entre religião e política? Acompanhe esse conteúdo produzido pela Politize!
Como a religião está presente na política?
O sociólogo português, Boaventura de Sousa Santos ajuda a responder essa questão. Ele chama de teologia política os discursos que reivindicam a presença da religião na esfera pública. Porém, ele notou que não há muitas semelhanças entre os diversos grupos e propôs uma tipologia para poder abordar a complexidade desta realidade.
Para entender tal tipologia é preciso lembrar que até cerca de dois séculos atrás religião e política andavam juntas. A coisa começou a mudar quando o Iluminismo propôs que o Estado deveria ser laico, ou seja, pautado pela lógica racional. Esta filosofia animou várias correntes que quando chegaram ao poder passaram a limitar a influência política das religiões.
Entretanto, até hoje líderes religiosos tentam responder a isso, buscando resgatar a posição de influência na vida pública dos textos sagrados, de modo que leis e valores religiosos passem a valer para todos. e
Para Boaventura, há duas formas de distribuir essas respostas teológicas:
Pluralistas: Acreditam que a revelação (ou textos sagrados) podem auxiliar na organização política da sociedade, porém aceitam a autonomia de ambas. O texto sagrado ocorre em um contexto social específico, portanto deve ser interpretado de modo a encontrar um princípio que possa ser aplicado no contexto social atual.
Fundamentalistas: Acreditam que textos sagrados devem estruturar a sociedade em todas as suas dimensões. Historicamente, este termo foi criado no início do século XX por protestantes do sul dos EUA que ao desejarem se diferenciar das teologias modernas determinavam “Os Fundamentos” que um cristão deveria seguir. Posteriormente, o termo ganhou uma acepção quase pejorativa ao ser aplicado a grupos radicais islâmicos. Tanto nos fundamentalismos cristãos quanto nos islâmicos há um princípio escrituralista*, ou seja, o texto sagrado independe do contexto social e deve ser entendido do modo mais literal possível.
O sociólogo traça ainda um segundo eixo para classificar tais teologias de acordo com suas intervenções políticas, definidas a seguir: :
Tradicionalistas:As diferenças sociais, por já existirem também nos textos sagrados, são encaradas como naturais, inevitáveis ou até mesmo um desígnio divino. O passado glorioso existente nos textos sagrados é usado para demonstrar que as regulações sociais daquela época funcionam e portanto são um bom caminho para resolver os problemas do presente.
Progressistas: As desigualdades são desnaturalizadas e vistas como decorrentes de questões de um sistema social e econômico que atenta contra os princípios da religião. Traçam uma distinção entre a religião que se preocupa com os “oprimidos” e uma religião institucional que ajuda a manter os privilégios de quem esteja no poder. O progressismo tem ainda uma tendência ecumênica e inter-religiosa.
Para entender como o tradicionalismo tem se relacionado com a política, pode-se usar o exemplo de George W. Bush. ex-presidente dos EUA. Durante a gestão, ele assumiu uma posição conservadora com relação às políticas sobre gravidez e DSTs na adolescência. Bush era contra a educação sexual para adolescentes e em razão disso preferiu apoiar campanhas sobre castidade, realizadas por grupos religiosos que incentivaram os jovens a manterem a virgindade como a melhor maneira de evitar uma DST ou gravidez na adolescência.
No Brasil, pode-se citar a forte presença de políticos religiosos. No Congresso, por exemplo, existe a bancada evangélica, uma bancada temática que agrupa deputados e senadores alinhados com pautas morais. Entre elas estão proibição do aborto, discussões sobre gênero e prevenção da homofobia.
Ao mesmo tempo existem outros grupos religiosos com postura mais progressista, que já se posicionaram publicamente contra leis que façam aumentar a violência contra homossexuais, por exemplo. Além disso, eles fazem parte de denominações pluralistas que abraçam pautas sociais, relacionadas a racismo, feminismo, desigualdade social e movimento LGBTQIA+.
O que o sociólogo português demonstra é que não é possível colocar todos os religiosos no mesmo grupo. Há diferenças causadas pela pluralidade de olhares políticos sobre os temas.
Se em um lado crescem visões fundamentalistas e tradicionalistas que buscam no passado o modo adequado que as mulheres devem se comportar, em outro lado, é os textos sagrados podem ser usado para defender para defenderem uma maior igualdade entre gêneros
Esta é uma tipologia aparentemente simples, porém muito poderosa para se analisar como as visões dos religiosos políticos se articulam com a visão de mundo da própria pessoa que olha. Porém, deve-se tomar sempre muito cuidado, pois dentro das próprias Igrejas há um debate de ideias e frequentemente o que uma liderança defende é bem diferente do que diz um colega seu.
Além disso, é importante observar que posturas políticas convergentes não significam que os grupos pensem igualmente. É possível que dois grupos muito diferentes concordem em torno de uma pauta, mas que cheguem àquela decisão por motivos muito diferentes.
Veja também nosso vídeo sobre o Brasil ser um estado laico!
A questão evangélica no Brasil
A comunidade evangélica vem crescendo e ganhando cada vez mais destaque na vida política brasileira, tanto como uma parcela importante do eleitorado, como elegendo representantes. Eles representam cerca de 30% da população e a projeção é que se tornem o principal grupo religioso, ultrapassando os católicos, nas próximas décadas.
Nas eleições presidenciais de 2022, esse grupo além de ser disputado pelos presidenciáveis, assumiu posições com relação à disputa. Enquanto os setores mais conservadores e tradicionais apoiavam a reeleição de Jair Bolsonaro, a parcela mais progressista voltou-se para Lula.
Assim como no passado, a religião e política continuam sendo próximas. A religião ainda é usada como instrumento para exercer poder, sendo hoje uma forma de influenciar a forma que as pessoas vão votar.
E aí, entendeu um pouco mais sobre como é a relação entre religião e política? Conta o que você acha aqui nos comentários!