Karoline Zilah No fim do ano passado, uma ex-funcionária de um bar no Bessa, em João Pessoa, denunciou ao Ministério Público do Trabalho que havia sido demitida por 'justa causa' após informar que estava grávida. Segundo a garçonete, a recomendação teria partido do sindicato, que, procurado pelo empregador, o aconselhou a não manter com o vínculo empregatício.
A demissão foi encarada pela Procuradoria Regional do Trabalho como uma prática discriminatória. O representante da empresa negou as acusações em audiência, mas concordou em firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com multa de R$ 5 mil caso repita o comportamento.
A Lei 9.029, de 13 de abril de 1995, impede a exigência de atestados de gravidez e esterilização de funcionárias. Com base nela, o ministro Carlos Lupi criou a portaria nº 1.249/2010, do Ministério do Trabalho e Emprego. Ela proíbe que as empresas do Brasil exijam de seus funcionários o teste de HIV em exames médicos admissionais e demissionais, avaliações periódicas ou em decorrência de mudanças de cargo do trabalhador, de forma direta ou indireta.
Exame de gravidez
“Esse tipo de postura gera indenização de dano moral em favor da pessoa prejudicada. Além de não impedir que a mulher exerça seu trabalho, a maternidade é um direito que goza de proteção constitucional”, explicou o procurador-chefe do Trabalho na Paraíba, Eduardo Varandas.
A jornalista Fernanda (nome fictício)*, de 24 anos, foi obrigada a fazer exame de gravidez em seu primeiro emprego. Ela foi submetida a uma bateria de exames de sangue e até cardíacos e precisou apresentar todos os resultados ao Departamento Pessoal da empresa. A exigência foi encarada com desconfiança por seus parentes.
“Na época não me incomodei muito porque eu era mais nova e não tinha discernimento sobre o assunto. Mas amadureci e hoje, que estou inserida no mercado de trabalho, acho totalmente desnecessário. Gravidez não impossibilita ninguém de trabalhar”, argumenta.
Teste de HIV/Aids
O mesmo vale para as avaliações de HIV/Aids. De acordo com a procurador Eduardo Varandas, esta exigência é prevista como crime. Nestes casos, o Ministério Público do Trabalho pode adotar medidas para inibir a prática e cobrar o pagamento de multa.
O sentimento de quem passa por uma situação como essa é de constrangimento. Foi o que sentiu o químico industrial André (nome fictício)*, de 30 anos, quando participou de duas seleções seguidas para o Curso de Formação de Oficiais (CFO) da Polícia Militar, há cerca de cinco anos.
Ele se surpreendeu ao saber que teria que fazer o teste de HIV, além de raio X, hepatite, hemograma, entre outros.
“Foi um constrangimento total, porque na época este exame só era feito gratuitamente num posto de saúde da cidade, então não havia nenhuma discrição. Se o candidato não apresentasse o resultado, era eliminado do concurso. No caso das mulheres, o edital deixava explícito que as grávidas não poderiam se inscrever, ou que a candidata não poderia engravidar durante o processo de treinamento”, compartilhou.
Com o advento da portaria que proíbe o exame de HIV em processos seletivos, a exigência foi retirada dos editais da Polícia Militar.
Perfil da saúde do trabalhador
O procurador Eduardo Varandas explica que não é proibido por fazer um levantamento sobre a situação biológica do funcionário. Segundo ele, as avaliações admissionais, periódicas e demissionais são previstas em lei, desde que o trabalhador não seja impedido de exercer sua função por causa deles. “O correto é recomendar um tratamento adequado para cuidar da saúde do funcionário, ao invés de exclui-lo”, explica.
A funcionária pública Ana Paula (nome fictício)*, de 26 anos, achou incômodo ter que cumprir uma lista de exames laboratoriais e atestados de sanidade física e mental solicitados por uma universidade federal na Paraíba. “O aprovado só poderia tomar posse caso apresentasse todos os resultados. Infelizmente, se você quer assumir o cargo, não tem o que discutir”, critica.
Outro problema é arcar com todas as despesas. “Eu tinha plano de saúde, mas quem não tinha precisou tirar do próprio bolso”, comentou. Segundo ela, ninguém chegou a ser desclassificado por causa dos exames, mas quem apresentava alguma anormalidade foi encaminhado para um tratamento de saúde.
Especificação de sexo e 'boa aparência'
Especificar sexo, faixa etária ou cobrar 'boa aparência' no momento de anunciar uma vaga também é considerada uma prática discriminatória. Nestes casos, o MPT adotou medidas educativas.
“Preciso confessar que, na prática, isso quase não funciona. A seleção para empresas privadas, quando não são feitas por meio de concurso público, são muito subjetivas e é difícil ter controle sobre isso. Não existe uma profissão 'feminina' ou 'masculina'. O que também preocupa é a oferta de emprego para as pessoas da terceira idade. É cada vez mais comum vermos grandes lojas que contratam apenas jovens. Mais do que perdendo vagas, os idosos estão perdendo o direito de trabalhar”, observa o procurador.
Denúncias
Caso o candidato desconfie que foi eliminado do processo por causa dos resultados de algum desses exames, pode reivindicar seus direitos na Justiça. A recomendação é procurar o Ministério Público do Trabalho. As denúncias podem ser feitas pela internet, telefone ou pessoalmente. Caso o denunciante queira, há garantia de anonimato.
Ministério Público do Trabalho Av. Almirante Barroso, 234 - Centro - João Pessoa (83)3612-3100 www.prt13.mpt.gov.br/
*os nomes foram mantidos em sigilo a pedido dos entrevistado
|