Quem é Alexandre de Moraes, o novo ministro do Supremo Tribunal Federal
Foto: Reprodução / Agência Brasil
Alexandre de Moraes sendo sabatinado no Senado
Alexandre de Moraes superou as controvérsias em torno de sua indicação ao Supremo Tribunal Federal e foi confirmado nesta quarta-feira como ministro na vaga aberta pela morte de Teori Zavascki.
O Senado aprovou a indicação do presidente Michel Temer por 55 votos a favor e 13 contra.
Considerando as últimas indicações, o apoio ficou acima do recebido por Edson Fachin em 2015 (52) e abaixo do obtido por Luís Roberto Barroso em 2013 (59). Zavascki recebeu 54 votos favoráveis.
Com apenas 48 anos de idade, Moraes terá ao menos 27 anos como magistrado do STF, já que apenas aos 75 anos a aposentadoria é obrigatória.
Após 13 indicações seguidas feitas por presidentes do PT, Moraes chega ao Supremo com apoio do PSDB e deve dar um viés mais conservador para a corte. Ele já se manifestou, por exemplo, contra a legalização do aborto e da eutanásia, por considerar que essas práticas violam o direito à vida. É contra a redução da maioridade penal, mas defende punições mais duras para menores de 18 anos em caso de crimes graves.
O desejo de Moraes de integrar o STF era notório no meio jurídico, mas parecia improvável no curto prazo, já que em 2015 o Congresso elevou a idade máxima para aposentadoria compulsória dos ministros de 70 para 75 anos.
Enquanto o sonho estava em suspenso, falava-se nos bastidores de Brasília que seu desejo seria concorrer ao governo de São Paulo pelo PSDB em 2018.
O impeachment da presidente Dilma Rousseff, que levou seu aliado Temer ao poder, associado à trágica morte de Zavascki acabaram criando uma inesperada porta de entrada para Moraes no STF.
Em meio à grave crise política pela qual passa o país, sob o impacto da operação Lava Jato, sua indicação foi alvo de críticas por sua suposta falta de imparcialidade. Para os opositores da sua nomeação, Moraes foi indicado ao Supremo para barrar as investigações contra membros do governo Temer e sua base no Congresso.
Moraes negou veementemente essas acusações nas quase 11 horas de sabatina com senadores nesta terça-feira e destacou não ser o primeiro indicado ao STF com histórico de atividade política. Salientou também que os coordenadores da Lava Jato elogiaram sua indicação publicamente.
Em sua fala inicial, disse que atuará no Supremo "com imparcialidade, coragem, dedicação e sincero amor à causa pública".
Depois, ao responder pergunta sobre sua tese de doutorado, em que defende que presidentes não deveriam poder indicar integrantes do governo para a Corte, prometeu: "Jamais atuarei entendendo que minha indicação ou eventual aprovação por vossas excelências tenha qualquer ligação de agradecimento ou favor político", afirmou.
Trajetória até Supremo
Em 15 anos, Alexandre de Moraes saiu do Ministério Público e deu início a uma trajetória que incluiu cargos de destaque na prefeitura e no governo de São Paulo.
Foi promotor de Justiça da Cidadania e assessor do procurador-geral do Estado entre 1991 e 2002, quando, aos 33 anos, se tornou o mais novo secretário de Justiça e Defesa da Cidadania do Estado, escolhido por Geraldo Alckmin (PSDB), com quem voltaria a trabalhar anos depois.
Em 2005, foi escolhido para integrar a primeira composição do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ocupando a vaga reservada para um representante da Câmara dos Deputados.
Após a passagem pelo CNJ, entre 2005 e 2007, trabalhou na gestão de Gilberto Kassab (PSD) na Prefeitura de São Paulo entre 2007 e 2010. No período, acumulou os cargos de presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), da São Paulo Transporte (SPTrans) e de secretário de Serviços e de Transportes, o que o transformava numa espécie de supersecretário.
Em 2015, voltou a participar de uma gestão de Alckmin, desta vez como secretário da Segurança Pública. Mas embora tenha construído uma carreira acadêmica focada nos direitos humanos, passou a ser visto com grande rejeição por movimentos sociais, que viram uma atuação "truculenta" por parte da polícia durante sua gestão.
Próximo de Temer, conquistou sua confiança ao conduzir com absoluta descrição e eficiência uma investigação que prendeu o hacker que invadiu o celular da primeira-dama Marcela e tentou extorqui-la.
Moraes já foi professor da USP e se tornou referência em direitos humanos
Acabou nomeado como ministro da Justiça logo após a destituição de Dilma, em maio de 2016. Acumulou desgastes nos meses em que ficou no cargo, mas resistiu a editorais de grandes veículos de mídia brasileiros que pediam sua cabeça.
Em um desses episódios, o ministro precisou se explicar após supostamente antecipar uma fase da operação Lava Jato.
"Teve a semana passada, e esta semana vai ter mais, podem ficar tranquilos. Quando vocês virem esta semana, vão se lembrar de mim", disse ele a um grupo de pessoas durante campanha eleitoral de prefeito no interior de São Paulo, em setembro passado.
No dia seguinte, ele negou que tivesse adiantando ações da Polícia Federal - afirmou que a afirmação ocorreu porque houve operações desde que ele assumiu o cargo de ministro da Justiça.
Jurista experiente
Além da vida política que o projetou nacionalmente, Moraes é um jurista experiente, reconhecido no meio acadêmico.
Formado em 1990 pela prestigiada Faculdade de Direito da USP, Alexandre de Moraes obteve o título de livre-docente em direito constitucional na mesma universidade 11 anos depois.
Além de dar aulas na mesma USP e na Universidade Mackenzie, escreveu diversos livros jurídicos que se tornaram referência em direito constitucional, direitos humanos, agências reguladoras e legislação penal especial.
Apesar do sucesso como autor, enfrentou desgaste diante das acusações de plágio em suas obras.
Em 13 de maio de 2004, ganhou a honraria mais alta do Tribunal de Justiça de São Paulo, o Colar do Mérito. Foi o jurista mais jovem a receber a homenagem, aos 35 anos.
Atuou também como advogado. Em 2014, defendeu o ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB), hoje prisioneiro da operação Lava Jato, de uma acusação de uso de documento falso - ele acabou absolvido.
Apropriado ao STF?
A mistura de currículo vistoso com polêmicas deixou sua indicação ao Supremo longe do consenso.
Orientador de doutorado de Moraes, o jurista Dalmo Dallari, professor emérito da Faculdade de Direito da USP, diz que respeitava a produção científica de seu orientando até se informar sobre suas ações na administração pública.
Dallari frisa uma portaria de janeiro que dava ao Ministério da Justiça o poder de rever as análises da Funai sobre demarcação de terras indígenas. Apesar de o documento ter sido revogado no dia seguinte, o jurista viu nele uma clara falta de "consciência jurídica".
"Foram portarias escancaradamente inconstitucionais e ilegais para favorecer invasores de áreas indígenas. E óbvio, se ele tivesse consciência jurídica, não faria uma coisa dessa."
Sem tal consciência, diz Dallari, Moraes também não teria notável saber jurídico e, logo, não se encaixaria nos preceitos constitucionais.
"Notório saber não significa apenas conhecimento do que está escrito na lei, é ter consciência do significado ético e social das normas de direito a partir da Constituição. Cheguei a conclusão de que realmente ele não preenche os requisitos."
Especialista em STF e colega de Moraes no Conselho Nacional de Justiça no início dos anos 2000, o professor Joaquim Falcão, da FGV-RJ, destoa do jurista.
Ele descreve Moraes como um vanguardista, que não cedia às pressões de ninguém e se comportava com "ousada independência".
Na visão de Falcão, Moraes não só cumpre os itens previstos na Constituição como seria ingênuo pensar que os ministros do tribunal votam de acordo com o presidente que os indicou.
"A experiência aqui mostra: Ayres Britto e Joaquim Barbosa foram indicados por Lula, (e condenaram réus do PT no mensalão). Acho que o futuro de qualquer ministro do Supremo está na mão dele próprio. É ingenuidade achar que as pessoas ficam dependentes."
BBC / Brasil
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