Marco Aurélio precipitou-se. Já não é a primeira vez, expedindo decisão diametralmente oposta à expectativa popular. O ministro decaiu de ouvir o plenário e sapecou um despacho liminar para conceder liberdade ao famigerado goleiro Bruno, qualificativo merecido por crime já apurado, praticado com requintes de crueldade, tanto que condenado pelo Tribunal do Júri de Contagem (onde realizou-se a instrução e julgamento do caso) a 23 anos de prisão.
Como um pequeno ajuntamento de palavras provoca, aos milhões, reações indignadas e incendiárias !
A repercussão do assassinato pela imprensa, despertando o interesse do país no desate das investigações e no julgamento, que envolvia uma quadrilha, foi justificado pela trama rocambolesca que o caracterizou. Por tratar-se de um caso que até registrou a presença da imprensa internacional, tudo recomendava ao relator posição de maior cuidado.
O motivo alegado pelo magistrado – excesso de tempo em que não se apreciou a apelação do condenado – não resiste a uma análise isenta. Este argumento, se procedente, superável seria se a apreciação do habeas corpus se fizesse em plenário, mas não se desse em decisão monocrática. O caso está sendo acompanhado pela sociedade mineira – e mesmo a brasileira – pelas particularidades extravagantes em que um personagem do futebol planejou e matou com barbarismos sua companheira. O despacho liberatório enfoca, enfático, que a justiça está tardando para Bruno, como se fora este aspecto motivo justo e plausível, quando a Justiça é na verdade lenta em todos os casos e em todo nosso território. A valer este entendimento corremos o risco concreto de solturas indiscriminadas e esvaziamento de todos os presídios.
Acresce o fato de o ministro Marco Aurélio haver mencionado, em seu despacho, que não há culpa formada. Ora, o juiz invadiu ou adentrou o mérito do caso, questão não aventada. Este convencimento não caberia a ele, mas ao tribunal que irá apreciar e deliberar sobre a apelação.
A sociedade, isto é, o Grande Júri, ainda se encontra alarmada com as etapas em que o goleiro atuou no episódio, calculadamente, e até hoje não revelou ele o destino do corpo. Ora, Bruno era o chefe da rede, a morte da infeliz mãe só interessava a ele, por isso, detinha o domínio do fato, teve amigos e cúmplices a auxiliá-lo neste acontecimento sinistro, então, negar-se a revelar onde ocultara o corpo é outra prova de confissão de um crime que pode fazer escola. Se o corpo de jurados, representante da sociedade na audição, leitura, observação e acompanhamento dos momentos cruciais do processo, como previsto em nossa lei processual penal, o condenou, porque a sociedade vai julgá-lo de forma diferente ? O clamor social (aspecto minimizado pelo ministro) é o sentimento e o julgamento do povo, e este povo está autorizado a fazer um juízo, sim, dos acontecimentos que o cercam, e há de ser componente valioso no julgamento definitivo, pois ele é que dará o tom da reprimenda da sociedade ao terrível ato praticado. Daí, o despacho ora questionado está em descompasso, também, com entendimento já esposado pelo STF de reconhecer-se a conveniência da custódia ou cautela prisional como indutora de encarceramento quando há irrefutável clamor popular.
O desate deste caso revolta mais a sociedade do que à própria família. A esperança do castigo se encontra no plenário do STF para consertar o inesperado e injustificado despacho de soltura.
O instituto penal do homicídio não pode render-se a adminículo supostamente técnico-legal.
José Maria Couto Moreira é advogado.
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