Um dos principais desafios de produzir leite está na área da saúde animal. Isso porque as vacas são animais que exigem muitos cuidados para produzir com qualidade e a falta de informação pode prejudicar a produção. Algumas doenças, como a mastite, tiram o sono do produtor de leite. Para combater essa doença, muitas vezes o produtor faz uso excessivo de medicamentos. A superdosagem é uma prática irresponsável que compromete a qualidade do leite, o seu uso no mercado e a saúde de quem consome, além de não garantir a saúde do rebanho e gerar prejuízos.
O uso de medicamentos é essencial para a saúde do animal. O antimicrobiano (antibiótico), por exemplo, é importante para viabilizar a produção de leite quando o sistema imunológico não consegue eliminar a infecção sozinho. Porém, é preciso saber como usar com cautela e sempre consultar um médico veterinário. “O tema é complexo e existe muita confusão e dúvida por parte dos produtores com relação à via de aplicação, dosagem, tempo de carência, interação entre medicamentos e finalidade do uso”, diz Athaide Newman Rodrigues da Silva, zootecnista e conselheiro da Associação Brasileira de Laticínios (Viva Lácteos).
Quais são os principais erros? Mesmo os produtores com um bom nível de conhecimento cometem erros quando no uso de medicamentos. “Eles compram e usam produtos sem acompanhamento de um profissional, sendo [essa] uma das principais causas de problemas e erros”, afirma Silva. O conselheiro da Viva Lácteos conta que ainda hoje a falta de conhecimento resulta em erros perigosos. “Encontramos em muitas propriedades casos em que vacas que tiveram um dos quartos tratados com um antimicrobiano intramamário, que requer um período de carência, terem o leite dos outros 3 quartos ordenhados e o leite ir para o tanque de resfriamento”, conta Silva.
Fora do padrão de qualidade A situação mostra a falta de conhecimento da fisiologia do animal e da produção de leite, já que o leite de nenhum dos quartos mamários deveria ser consumido ou comercializado durante a carência. “Quando esse leite chegar na plataforma de uma indústria será rejeitado por se apresentar fora do padrão da legislação e ou fora dos padrões de controle internos, positivos para os testes para resíduo de antimicrobiano”, diz o conselheiro da Viva Lácteos. “Com uma correta orientação de um profissional isso poderia ser evitado.” Consumo arriscado Ele ainda conta que já houveram casos em que um produtor separava o leite de animais tratados com antimicrobiano e utilizava o mesmo para consumo da família, desconhecendo o risco que estava colocando os familiares.
O resíduo de antimicrobiano, além de ser um risco a saúde humana, pode causar reações alérgicas e alguns têm potencial cancerígeno, afirma Silva. “Depois de orientado, [o produtor] passou a descartar esse leite, não utilizando o para consumo interno ou para envio a indústria”, diz Silva. “Há muitos produtores que têm conhecimento, consciência, cuidado ao manipular os medicamentos e seguem as orientações de profissionais, mas a situação citada anteriormente ainda ocorre nos dias de hoje.”
Na Europa, por exemplo, alguns países implementaram, desde 1997, políticas mais rígidas de controle e restrição de uso desses medicamentos na produção animal, uma vez que eles associam seu uso indiscriminado e de forma incorreta ao aumento da resistência microbiana, que eleva o risco do aparecimento das chamadas superbactérias, conta o zootecnista. Riscos e prejuízos O uso excessivo de medicamentos pode causar problemas dentro da propriedade rural, como a intoxicação dos animais, perda de produção e perdas financeiras pelo uso desnecessário do produto. Além disso, os transtornos também serão identificados na indústria. Já para o produtor, o uso irresponsável de medicamentos gera o descarte do leite contaminado.
Alternativas Algumas alternativas aos medicamentos veterinários são os tratamentos preventivos como, por exemplo, o uso de vacinas que são substâncias, como proteínas, toxinas, partes de bactérias ou vírus, ou vírus e bactérias inteiros, atenuados ou mortos. “Quando aplicadas no organismo de um animal provocam a reação do sistema imunológico semelhante à que ocorreria no caso de uma infecção por um determinado agente patogênico, desencadeando a produção de anticorpos que tornam o organismo imune ou, ao menos mais resistente, a esse agente”, diz Silva.
O que precisa mudar? Consultar um profissional, principalmente quando o assunto é saúde, é uma orientação básica. Mas, mesmo assim, muitos produtores não contratam um médico veterinário para atender sua propriedade. “A avaliação, prescrição de medicamentos e orientações são baseados nas informações de profissionais que estão no balcão das lojas veterinárias ou vendedores, que na sua grande maioria não conhecem a propriedade, as condições da mesma, os animais envolvidos”, diz Silva.
Receituário Um dos problemas identificados pelo zootecnista é que no Brasil a venda de muitos medicamentos veterinários é feita sem a necessidade e retenção do receituário, que deve ser feita por um veterinário, o que dificulta a fiscalização e controle sobre a venda desses produtos e a utilização sem a devida orientação. “Somente uma maior regulação e a correta orientação, por si só não resolvem, é necessário que as recomendações e boas práticas relacionadas ao uso de medicamentos sejam realmente aplicadas”, afirma o conselheiro da Viva Lácteos.
Dicas para evitar excessos Para reduzir os danos que o uso irresponsável dos medicamentos pode causar, o produtor e a sua equipe devem se manter informados e capacitados para cuidar do rebanho e entender a finalidade da aplicação de cada produto. E antes de usar qualquer medicamento veterinário consultar um médico veterinário que conheça a realidade da produção.
Neste ano, a Viva Lácteos produziu uma cartilha com orientações sobre o uso responsável de medicamentos veterinários na produção de leite, com acesso online gratuito (acesse aqui). “Sabemos que as boas práticas no uso de medicamentos veterinários, quando bem aplicadas, podem reduzir perdas e custos desnecessários, tanto para produtores, como para a indústria, trazendo benefícios a cadeia”, diz o conselheiro da Viva Lácteos.
Por Naiara Araújo (naiara@sfarming.com.br)
|