Em maio de 2014, o ex-presidente Lula foi recebido em Angola como “convidado especial” do então presidente José Eduardo dos Santos, com direito a honras de chefe de Estado, tratamento vip e um jato à disposição. De avião, Lula foi até uma usina de açúcar e etanol, na província de Malanje, construída e controlada por meio de uma parceria da Odebrecht com o governo local. O ex-presidente era o palestrante mais vistoso de um seminário de combate à fome organizado pela Fundação Eduardo dos Santos (Fesa), cujo patrono era o próprio presidente angolano. Pelos minutos em que falou sobre os programas sociais de seu governo, Lula recebeu quase meio milhão de reais de cachê, pago pela empreiteira brasileira, que um ano depois cairia na rede da Lava-Jato. Para conseguir obras e gordos contratos no país africano, a Odebrecht pagou 166 milhões de reais em propina. Documentos de uma investigação conduzida por autoridades da Suíça expõem a extensão do esquema de corrupção da Odebrecht em Angola. As tramoias da empreiteira foram reveladas pelo ex-diretor da empresa na África Ernesto Baiardi. Em depoimento, o executivo detalhou como e a quem a companhia pagava subornos para garantir bons negócios no país. Um dos beneficiários, não por acaso, era exatamente o presidente da Fundação Eduardo dos Santos, Ismael Diogo da Silva. De acordo com Baiardi, Ismael, homem de confiança do ex-presidente de Angola, recebeu 8,2 milhões de dólares (25 milhões de reais) entre 2008 e 2013. O dinheiro, claro, deve ter sido aplicado no combate à pobreza. No índice global da fome, Angola figura na 95ª posição no ranking de 119 países avaliados. A Odebrecht também financiou o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), o partido do governo. A legenda comanda o país desde os anos 70, quando foi decretada a independência de Portugal, e implantou uma ditadura comunista — a típica, daquela em que o povo é pobre e os dirigentes do partido são milionários. Nas eleições legislativas de 2008, a empreiteira destinou 5 milhões de dólares (15 milhões de reais) ao MPLA. Os subornos da Odebrecht envolveram o alto escalão do governo. Entre 2008 e 2010, a empresa desembolsou 4,8 milhões de dólares (15 milhões de reais) em “vantagem indevida” ao ex-ministro de Finanças de Angola José Pedro de Morais — em contrapartida, ele garantia o pagamento prioritário das faturas da companhia. Na lista de beneficiados da Odebrecht, estavam ainda o atual ministro de Petróleo, o ex-chefe do banco nacional de Angola e o ex-vice-ministro do Comércio. O ex-diretor da Odebrecht na África também confirmou que Taiguara Rodrigues, sobrinho de Lula, foi favorecido com pagamentos de propinas referentes à obra da hidrelétrica de Cambembe. Ex-vidraceiro, o jovem se tornou um empresário bem-sucedido ao assinar contratos milionários com a Odebrecht sem precisar bater um prego — uma mãozinha financeira que a empreiteira deu ao rapaz atendendo a pedido do tio famoso. O ex-presidente e seu sobrinho são réus no processo que apura fraudes em contratos do BNDES, banco público que emprestou dinheiro para financiar os projetos de infraestrutura da Odebrecht em Angola. Em última instância, era de lá que saía a propina para Lula, José Eduardo, Taiguara e outros. Fome e dinheiro As negociatas entre Lula e a Odebrecht em Angola também foram reveladas pelo ex-ministro Antonio Palocci. Em um dos capítulos de sua colaboração premiada, Palocci relata pagamentos da Odebrecht ao PT no valor de 64 milhões de reais. Esses recursos foram repassados pela empreiteira ao partido em razão dos contratos de financiamento obtidos junto ao BNDES para obras de infraestrutura no país africano. O caso foi investigado e resultou numa ação penal em que Lula, Palocci e o ex-ministro Paulo Bernardo viraram réus, acusados de arrecadar propinas da Odebrecht para o PT. José Eduardo dos Santos deixou o governo em 2017. A filha dele, a empresária Isabel dos Santos, é a mulher mais rica da África, dona de uma fortuna estimada em 2,3 bilhões de dólares. No comunismo ou no socialismo, sem a imprensa a lhes importunar, é comum que os filhos de dirigentes sejam prodígios em termos de acumulação financeira.
Mobilizado para aprovar o nome de Eduardo Bolsonaro para a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos, o governo aposta suas fichas na tese de que uma rejeição significaria uma espécie de ofensa pessoal ao presidente da República, segundo um dos envolvidos na articulação. O fato de Eduardo ser filho de Jair Bolsonaro e a disposição do presidente de defender publicamente a indicação — como o fez em diversas entrevistas à imprensa — são vistos como uma forma de pressão para um desfecho positivo para o governo. Apesar de trabalhar com essa perspectiva, durante as conversas com senadores, responsáveis por analisar a indicação, a ideia do governo é não citar a possibilidade de retaliação em caso de rejeição. A estratégia passa por tentar pormenorizar as relações de Eduardo com a família e o governo de Donald Trump. Ao núcleo duro, Eduardo vem falando sobre a sua proximidade com Jared Kushner, genro de Trump e conselheiro da Casa Branca, e Kim Breier, secretária-adjunta para o Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado americano. Ele já esteve pessoalmente com ambos — ela, no entanto, pediu demissão anteontem. Boné de Trump não ajuda O parlamentar também admite a pessoas próximas que terá uma sabatina longa e dura. Sabe que um dos principais questionamentos será sobre o seu comportamento diante da possível eleição de um presidente americano do Partido Democrata em 2020. Como já posou para foto com um boné de apoio à reeleição de Trump e usa a relação com o mandatário republicano como principal trunfo, terá de explicar o que faria caso um oponente de Trump seja eleito. Anteontem, a largada de Eduardo para convencer senadores foi com o presidente da Comissão de Relações Exteriores (CRE) da Casa, Nelsinho Trad (PSD-MS), que o preveniu sobre a divisão entre os integrantes do colegiado quanto à sua indicação. Jair Bolsonaro ainda não oficializou a indicação ao Senado. Nas últimas entrevistas, ele disse que o faria no retorno do Congresso. Com quem conversa, Eduardo diz não saber se o agrément sobre sua indicação já foi recebido pelo Itamaraty. Na diplomacia, o agrément é o consentimento dado por um país após consulta do interessado em indicar um nome para a embaixada. Em um primeiro momento, Eduardo dará prioridade às visitas aos gabinetes dos 18 senadores que fazem parte da Comissão de Relações Exteriores. Isso porque a primeira etapa da indicação é uma sabatina no colegiado e, na sequência, a votação de seu nome pelos integrantes. Depois, o processo segue para o plenário da Casa. Na visita de Eduardo, Nelsinho Trad relatou a ele sobre a divisão no colegiado que preside. — Há um equilíbrio muito grande (de aprovação e reprovação). Há um empate sem margem de erros, antecipou Trad.
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