Maioria do STF que vai reavaliar caso da Lava Jato critica operação
Decisão de Toffoli de anular provas passará pela Segunda Turma da Corte
O recurso de procuradores da República que questionam a decisão do ministro Dias Toffoli de anular um acordo de leniência da Odebrecht na última quarta-feira (6), será analisado pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). A maioria no colegiado é composta por ministros “garantistas”, sendo três deles críticos da Operação Lava Jato.
Na véspera do feriado da Independência do Brasil, Toffoli proferiu uma decisão anulando todas as provas obtidas por intermédio de um acordo de leniência que a Odebrecht fez no bojo da Lava Jato. A decisão ganhou contornos polêmicos por causa das críticas que o ministro fez à força-tarefa e à prisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), chamada por ele de “um dos maiores erros judiciários do país”.
O ministro disse que o gesto foi o “verdadeiro ovo da serpente” e ordenou que agentes públicos envolvidos com a operação sejam investigados – colocando Sergio Moro e Deltan Dallagnol na mira das autoridades.
– Sob objetivos aparentemente corretos e necessários, mas sem respeito à verdade factual, esses agentes desrespeitaram o devido processo legal, descumpriram decisões judiciais superiores, subverteram provas, agiram com parcialidade e fora de sua esfera de competência – disse o magistrado.
Além do inconformismo dos próprios lavajatistas, a Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR) também decidiu se opor à decisão de Toffoli, apresentando um recurso para a Segunda Turma do Supremo nesta segunda-feira (11). O pedido será analisado por Gilmar Mendes, Edson Fachin, Kassio Nunes Marques, André Mendonça, além do próprio Dias Toffoli.
A Associação Nacional de Juízes Federais (Ajufe) também deve recorrer. As duas entidades, ANPR e Ajufe, representam procuradores e juízes federais – funções que eram exercidas por Dallagnol e Moro, respectivamente. Apesar de os dois serem os nomes mais emblemáticos da força-tarefa, a ordem de Toffoli de investigação das autoridades se estende a todos que atuaram na Lava Jato.
CAMINHOS DENTRO DA CORTE Apesar de o Supremo ser a última instância de julgamento do Judiciário brasileiro, há várias etapas pelas quais um processo passa dentro da Corte. As decisões podem ser monocráticas (só de um ministro), da Turma (Primeira ou Segunda) ou do plenário (com todos os ministros). Na última quarta, a anulação do acordo de leniência da Odebrecht foi uma decisão monocrática de Dias Toffoli. Por isso, os questionamentos sobre ela agora vão para a Segunda Turma.
Dentro desse grupo, há pelo menos três magistrados – Gilmar, Toffoli e Fachin – que são críticos à Lava Jato e que podem manter a decisão. Eles são considerados mais “garantistas”, ou seja, preocupados com os direitos fundamentais dos reús.
Gilmar Mendes é o mais enfático nas críticas à força-tarefa. Como mostrou o Estadão, ele já disse, por exemplo, que delação premiada seguida de soltura de preso “é coisa de pervertido”. Também, chamou a Lava Jato de “esquadrão da morte” e disse que a operação “tem melhores publicitários do que juristas”, além de defender publicamente a investigação de Moro e Dallagnol pelos atos que reputa como excessos.
Em março de 2021, partiu das mãos de Edson Fachin a anulação de todas as condenações criminais que pairavam sobre Lula. O ministro declarou a 13ª Vara Federal de Curitiba – que era conduzida por Moro – incompetente para julgar os casos, motivo pelo qual tudo que foi feito dentro dessa jurisdição se tornou nulo. A decisão colocou o petista de volta ao páreo eleitoral.
Apesar de ter se aproximado de Jair Bolsonaro (PL) durante a gestão do ex-presidente, Dias Toffoli sempre foi um crítico da Lava Jato. As afirmações feitas na decisão na última quarta não destoam das opiniões que o ministro já externou sobre a força-tarefa em outras ocasiões. Em 2019, quando foi presidente do STF, em duas ocasiões o magistrado disse que a Lava Jato “não é uma instituição” e “destruiu empresas”.
O que Nunes Marques e André Mendonça podem decidir ainda é uma incógnita. Indicados ao Supremo por Bolsonaro, os dois ministros tendem a ter posições mais conservadoras, mas podem acompanhar os pares da Segunda Turma quando o tema for Operação Lava Jato.
Diante de um conjunto de atos jurisdicionais praticados a partir do momento em que assumiu a 13ª Vara Federal de Curitiba, o juiz federal Eduardo Appio revelou sua parcialidade para processar e julgar as ações relacionadas à finada “lava jato”. Reconhecida sua suspeição, todos os seus atos devem ser anulados.
Essa foi a conclusão unânime da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que na quarta-feira (6/9) declarou a nulidade de todo os atos praticados por Appio nas ações lavajatistas. O magistrado já estava afastado do cargo por decisão do Conselho Nacional de Justiça.
Para analisar o caso de Appio, que foi alvo de 28 arguições de suspeição pelo Ministério Público Federal, o relator da matéria, desembargador Loraci Flores, usou a mesma razão de decidir que o Supremo Tribunal Federal empregou para declarar a suspeição de Sergio Moro nos casos contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A ideia era analisar, diante de todo o conjunto de atos jurisdicionais praticados pelo magistrado, se ele mantinha a percepção de um juiz despido de todo e qualquer preconceito acerca dos temas que tinha sob sua competência. A resposta, para o colegiado, foi negativa.
Para isso, o acórdão do TRF-4 citou a fama que Appio construiu de crítico da “lava jato” e da prisão de Lula, o fato de o magistrado assinar seus processos eletrônicos como “LUL22” quando integrava a 2ª Turma Recursal e também o envolvimento pessoal com alvos do grupo de procuradores de Curitiba.
Appio fez um negócio jurídico com o deputado federal André Vargas — a venda de um imóvel que, posteriormente, levou à condenação do parlamentar pela “lava jato” sob a acusação de lavagem de dinheiro por meio da falsidade na declaração do preço. Vargas foi, posteriormente, absolvido pelo TRF-4.
O TRF-4 apontou ainda o fato de o pai de Appio, o ex-deputado Francisco Appio, integrar a lista de autoridades supostamente beneficiadas por pagamentos feitos pela Odebrecht.
A lista integra um conjunto de elementos colhidos pela “lava jato” nos sistemas da Odebrecht e que foi declarado nulo pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, em decisão tomada no mesmo dia do julgamento do TRF-4, horas antes.
Para o desembargador Loraci Flores, no entanto, não pode soar como desconhecido o fato notório de que empresa, segundo amplamente divulgado, esteve envolvida, em alguma medida, com os fatos que vinham sendo investigados pelo grupo de procuradores de Curitiba.
Isso, portanto, seria um elemento objetivo para recomendar que Eduardo Appio não tomasse a iniciativa de se inscrever, em primeira opção, no concurso de remoção que previa o preenchimento da vaga de juiz titular da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Anula tudo
Para anular todos os atos de Appio, o desembargador Loraci Flores considerou que, embora as exceções de suspeição tenham sido interpostas em apenas parte dos processos que tramitam na vara, ela estende-se a todos os processos da “lava jato”.
“Isso porque, como visto, as circunstâncias ora analisadas não dizem respeito a fatos específicos relacionados a cada um dos processos originários a que as exceções de suspeição estão vinculadas, mas demonstram a parcialidade do juízo excepto em relação a toda operação”, justificou o magistrado.
Ao fim e ao cabo, a suspeição de Appio não se deu por alguma das previsões feitas no artigo 254 do Código de Processo Penal. Com base em jurisprudência do STF, o TRF-4 entendeu que a listagem é exemplificativa.
A posição dá solução aos processos em um ponto que o próprio Appio viu como instransponível. Ao analisar as arguições de suspeição, ele indeferiu os pedidos do MPF e extinguiu os feitos sem julgamento do mérito porque não se apontou qual seria o inciso do artigo 254 do CPP violado.
A visão do TRF-4 é de que, como a listagem não é taxativa, basta àquele que alega a suspeição do julgador trazer elementos objetivos que poderiam demonstrar a situação de parcialidade.
Além disso, o TRF-4 decidiu julgar apenas a primeira das 28 exceções de suspeição feitas pelo MPF, determinando a baixa das demais. Isso porque tratam-se de alegações semelhantes, apenas vinculadas a processos originários distintos.
Justiça reconhece união estável de trisal para registro do filho
A criança será registrada com um pai e duas mães
A Justiça do Rio Grande do Sul reconheceu a união estável de um trisal no dia 28 de agosto, permitindo assim que o filho que está sendo gerado por uma das mulheres seja registrado em nome das três pessoas.
A decisão foi dada pela 2ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Novo Hamburgo, na Região Metropolitana de Porto Alegre, referente a uma união entre três pessoas, sendo um homem e duas mulheres.
O Ministério Público (MP) pode recorrer, tendo 30 dias para se manifestar sobre a decisão da primeira instância.
De acordo com o advogado do trisal, Álvaro Klein, Denis e Letícia estão casados desde 2006 e buscam há dez anos reconhecer a relação que eles dois mantêm com outra mulher, Keterlin. Essa segunda mulher está grávida e o bebê deve nascer em outubro.
– Eles queriam uma segurança e encontraram ela na forma do casamento. Até pela questão de cuidado um com o outro e garantias. Como é uma relação longa, já há uma dinâmica familiar, entre amigos e conhecidos. Foi mais um passo no relacionamento deles – disse o advogado à RBS TV.
Antes de ir à Justiça, o trisal tentou registrar a união no cartório, mas o pedido foi negado. O tabelionato exigia que primeiro eles se divorciassem, para então apresentar o pedido.
– Sempre teve nos nossos planos ter filhos e quando aconteceu decidimos buscar a Justiça. Ficamos extremamente felizes com a decisão, afinal, são dez anos. Muitos dos relacionamentos “normais” nem chegam a tanto – disse Letícia
Com a decisão, abre-se precedente para que os cartórios sejam obrigados a aceitar esse tipo de registro.
Engenheiro cedido terá de retornar a Rondônia após 20 anos no Rio de Janeiro
Ele não foi transferido definitivamente, mas apenas cedido de forma provisória, embora reiterada
TST
Capacete de engenheiro sobre mesa com notebook
Por unanimidade, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso de um engenheiro que pedia para permanecer no Rio de Janeiro (RJ) após ter sido cedido por 20 anos pela Companhia Energética de Rondônia (Ceron) às Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras). Segundo o colegiado, não ficou caracterizada a mudança definitiva, e o empregador pode encerrar a cessão a qualquer tempo por ato unilateral.
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Adicional
Na ação, o engenheiro disse que havia sido admitido na Ceron, empresa do sistema Eletrobras, em 1983 e, em 1996, foi transferido para o Rio de Janeiro para a líder do grupo econômico, onde recebia as mesmas vantagens de seus empregados e chegou a receber uma medalha por 20 anos de serviço. Em julho de 2017, porém, foi informado de que teria de voltar a Rondônia.
Seu argumento era o de que sua transferência fora definitiva, apesar do recebimento de um adicional mensal e da renovação anual da cessão. Segundo ele, sua família está radicada no Rio de Janeiro, a mulher é concursada em cargo público, a filha está na universidade e a mãe, de 85 anos, depende dele financeira e emocionalmente. Além do reconhecimento de vínculo com a Eletrobras e sua permanência no Rio, ele pretendia a incorporação do adicional ao salário.
Empresa
A Eletrobras afirmou, em sua defesa, que a cessão não fora definitiva e que o adicional apenas é devido enquanto perdurasse essa situação, não podendo ser incorporado ao salário nem mantido na hipótese de retorno para Rondônia. A companhia ressaltou que a cessão, como toda e qualquer cessão, era renovada periodicamente, sempre no interesse das partes envolvidas, e que o empregado estava ciente disso desde a transferência originária.
Cedido
O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região considerou válido o término da cessão, por ter ficado comprovado nos autos que o empregado não fora transferido definitivamente. Para o TRT, a precariedade da cessão não se altera pelo fato de ter perdurado por muitos anos, e não há como reconhecer o direito adquirido do engenheiro à manutenção da situação.
Cessão x transferência
O relator do recurso de revista do engenheiro, ministro Amaury Rodrigues, observou que a cessão tem caráter provisório e não se confunde com a transferência, disciplinada no artigo 469 da CLT, em que o empregado continua trabalhando para o empregador. Ele explicou que, na cessão, o empregado, sem a suspensão ou a interrupção do vínculo funcional com a origem, passa a atuar fora da unidade de lotação ou da empregadora. A medida é legalmente prevista entre empresas públicas e não gera vínculo de qualquer natureza com a cessionária, que, no caso, fazia parte da administração pública indireta.
Moralidade
Na avaliação do relator, a pretensão do empregado, na realidade, é consolidar o vínculo na Eletrobras, ainda usufruindo dos benefícios que ambas as empresas concediam. Ele explicou que, mesmo que tenha prestado serviços por diversos anos à Eletrobras, o engenheiro não tem direito a integrar seus quadros porque, para isso, teria de ter sido aprovado em concurso público. Nesse sentido, lembrou que, embora tenha sido admitido na Ceron em 1983, a cessão se deu depois da promulgação da Constituição Federal de 1988.
Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.
A tese surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado.
Em 2003, foi criada a Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, mas uma parte dela, ocupada pelos indígenas Xokleng e disputada por agricultores, está sendo requerida pelo governo de Santa Catarina no Supremo Tribunal Federal (STF).
O argumento é que essa área, de aproximadamente 80 mil m², não estava ocupada em 5 de outubro de 1988.
Os Xokleng, por sua vez, argumentam que a terra estava desocupada na ocasião porque eles haviam sido expulsos de lá.
A decisão sobre o caso de Santa Catarina firmará o entendimento do STF para a validade ou não do marco temporal em todo o País, afetando mais de 80 casos semelhantes e mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas que estão pendentes.
Nunes Marques aponta expansão ilimitada de áreas indígenas se não houver marco.
Argumentos favoráveis
Em 2021, o ministro do STF Nunes Marques votou a favor do marco temporal, no caso de Santa Catarina, afirmando que, sem esse prazo, haveria “expansão ilimitada” para áreas “já incorporadas ao mercado imobiliário” no País.
O ministro avaliou ainda que, sem o marco temporal, a “soberania e independência nacional” estariam em risco.
Ele destacou que é preciso considerar o marco temporal em nome da segurança jurídica nacional. “Uma teoria que defenda os limites das terras a um processo permanente de recuperação de posse em razão de um esbulho ancestral naturalmente abre espaço para conflitos de toda a ordem, sem que haja horizonte de pacificação”, disse. [Esbulho é a perda de uma terra invadida.]
Segundo Marques, a posse tradicional não deve ser confundida com posse imemorial.
Marques citou que a Constituição deu prazo de cinco anos para que a União efetuasse a demarcação das terras. Para ele, essa norma demonstra a intenção de estabelecer um marco temporal preciso para definir as áreas indígenas.
O ministro também entende que a ampliação da terra indígena de Santa Catarina requerida pela Funai é indevida, por se sobrepor a uma área de proteção ambiental.
Para Fachin, direito dos indígenas à terra é originário, anterior ao próprio Estado
Argumentos contrários
Representantes dos povos indígenas afirmam que o marco temporal ameaça a sobrevivência de muitas comunidades indígenas e de florestas.
Afirmam também que trará o caos jurídico ao País e muitos conflitos em áreas já pacificadas, por provocar a revisão de reservas já demarcadas.
O ministro Edson Fachin é o relator do caso e foi o primeiro a votar. Ele foi contrário ao marco temporal.
Para ele, a proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que os indígenas tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal e da configuração de renitente esbulho.
O ministro também afirmou que a Constituição reconhece que o direito dos povos indígenas sobre suas terras de ocupação tradicional é um direito originário, ou seja, anterior à própria formação do Estado.
Fachin salientou que o procedimento demarcatório realizado pelo Estado não cria as terras indígenas – ele apenas as reconhece, já que a demarcação é um ato meramente declaratório.