Com a expansão dos cartéis mexicanos para além do comércio ilegal de drogas — incluindo setores como transportes e alimentos —, os grupos se transformaram no quinto maior empregador do país, com cerca de 175 mil membros, revelou um novo estudo publicado na quinta-feira na revista Science.
A partir da análise de dados de homicídios, desaparecimentos, prisões e disputas entre facções rivais coletados ao longo de uma década, a pesquisa chegou a uma estimativa do total de pessoas que trabalhariam para essas organizações criminosas. Segundo o artigo, embora muitos membros não estejam envolvidos diretamente em atividades violentas, os resultados evidenciam a influência da vez maior dos cartéis no México — que hoje possui 198 grupos criminosos identificados, muito deles contratados por empresas para a prestação de outros serviços.
A nível nacional, os cartéis de Sinaloa e Jalisco são os maiores e disputam o domínio de vários territórios. De acordo com os autores do estudo, a melhor forma de reduzir os altos índices de violência no país seria acabar com as suas formas de recrutamento. Políticas focadas em aumentar o número de prisões podem, na verdade, impulsionar a taxa de homicídios e beneficiar os grupos, segundo o artigo.
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"Mais de 1,7 milhão de pessoas na América Latina estão encarceradas, e adicionar mais pessoas a prisões saturadas não resolverá o problema da insegurança", escreveram os autores.
Entre 2007 e 2021, o número de homicídios mais que triplicou no México, elevando o país a uma das taxas mais altas da América Latina, com quase 27 vítimas para cada 100 mil habitantes. Em 2022, 27,4% das famílias mexicanas relataram que ao menos um de seus membros já haviam sido vítimas de um crime, segundo a Pesquisa Nacional de Vitimização e Percepção da Segurança Pública.
No entanto, considerando que os tentáculos do crime organizado no país já controlam negócios de todos os tipos — até mesmo aqueles originalmente legais, mas operados de modo ilegal pelos grupos —, o impacto para a população pode ser ainda maior e mais sutil. Até os preços do abacate ou da clássica tortilla, por exemplo, estão saindo mais caros por interferência do narcotráfico.
Nesse contexto, a Confederação Mexicana de Empregadores (Coparmex) participará de uma reunião nesta sexta-feira para discutir soluções para o problema da violência, chamada de Diálogo Nacional pela Paz. "Está claro que os empresários têm medo de ver mais empresas tomadas à força, medo de entregar a economia aos criminosos", disse a organização em comunicado.
O Instituto para Economia e Paz (IEP), um centro global de pesquisa e análise sem fins lucrativos, estimou o impacto econômico da violência no México em 2022: 4,6 trilhões de pesos (R$ 1,3 trilhões). Isso equivale a 18,3% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. No mesmo ano, o governo federal gastou 0,6% do PIB em segurança, informou o IEP.
O impacto per capita é ainda mais frustrante. Cada mexicano sofreu uma perda econômica de 35.705 pesos — mais que o dobro do salário médio mensal — e o crime nas cadeias de produção de alimentos acrescenta dois pontos percentuais à inflação do país, de acordo com uma estimativa da Universidade Autônoma do México.
Imagens de um mercado vazio em Chilpancingo, capital do estado de Guerrero, viralizaram nas mídias sociais no ano passado. De acordo com vários relatos da mídia, oito pessoas envolvidas na venda e distribuição de frango para consumo humano foram mortas em uma semana. Também foi relatado um incidente no qual um grupo de homens armados assassinou um empresário distribuidor de frangos à vista de compradores e clientes. Nas semanas seguintes ao incidente, o frango tornou-se escasso na localidade. Mercados e lojas de aves fecharam.
No Estado do México e em Michoacán, também houve escassez e aumentos no preço do frango devido à extorsão pelo crime organizado, pois os vendedores não têm outra opção a não ser repassar a conta aos consumidores para preservar seus negócios.
Em março do ano passado, o Congresso convocou um painel de especialistas para analisar as causas da pesca ilegal. A principal é a falta de inspeção e a segunda é a presença do crime organizado. É possível que uma inclua a outra. A apreensão de pesca legal e ilegal está centrada no Golfo da Califórnia e nos estados de Sinaloa, Sonora, Baja California e Baja California Sur, de acordo com uma investigação da mídia Contralínea. Mas, na realidade, ela ocupa todos os litorais.
No ano passado, as frutas e os legumes que sofreram a maior inflação como resultado do crime. Em apenas uma quinzena, o tomate subiu 16,7%, o pimentão serrano 15% e o abacate 4,73%. Este ano, o estado de Nuevo León registrou um aumento de 50% no preço dos limões entre agosto e setembro, de acordo com dados do Ministério da Economia.
Isso tem suas raízes em Michoacán, um estado que exporta e abastece grande parte do país com produtos agrícolas. Em 11 de setembro, três cortadores de limão foram mortos em um ataque armado que, segundo as autoridades, foi perpetrado pelo crime organizado no município de Tepalcatepec. Zamora, outro município produtor de limão, tornou-se o epicentro de disputas no estado de Michoacán entre cartéis de drogas rivais, de acordo com o IEP. O mesmo se aplica às outras culturas cultivadas em Michoacán.
TRANSPORTE
A Associação Nacional de Transportadores (ANTAC) informou em julho que o roubo de cargas acumula 2,3 bilhões de pesos (cerca de US$ 676 milhões) em perdas por ano. Os empresários, no entanto, afirmam que o valor é muito maior. De acordo com a empresa AI27, o roubo anual está próximo de R$ 1,4 bilhão. As autoridades contabilizaram 13.199 crimes cometidos contra transportadores no ano passado, um aumento de 6,7% em relação a 2021.
O transporte público também é um alvo dos grupos. Entre julho e a primeira semana de agosto, 14 motoristas de ônibus foram mortos somente no município de Chilpancingo, em Guerrero. Em Michoacán, o crime organizado arrecada 21 milhões de pesos em dinheiro de extorsão de passageiros do transporte público, de acordo com informações do jornal Excélsior. E o huachicol, como é conhecido o roubo de gasolina, é um problema tão generalizado que tem sido o foco do governo do presidente Andrés Manuel López Obrador.
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Em janeiro, os motoristas de táxi do resort turístico de Cancún reagiram com bloqueios de estradas, violência contra motoristas, passageiros e até mesmo autoridades à permissão que o aplicativo Uber recebeu em Quintana Roo para operar legalmente. Semanas depois, relatórios não confirmados na mídia local e nacional propuseram que isso se devia ao fato de o setor ter sido cooptado pelo crime organizado. Isso coincide com um relatório da empresa internacional de inteligência de segurança Insight Crime, que, desde 2013, alertou que os motoristas de táxi estavam sendo alvo de organizações criminosas. O objetivo é forçá-los a transportar e vender drogas, informou a empresa. (Com El País).
Fonte: O Globo