Ana Carolina Oliveira, mãe de Isabella Nardoni, assassinada em 29 de março de 2008, entrou na Justiça de São Paulo com uma ação indenizatória por danos morais no valor de R$ 100 mil contra o médico alagoano George Sanguinetti por causa do livro “A morte de Isabella Nardoni - Erros e Contradições Periciais”, que ele escreveu e pretende publicar ainda este ano. A obra, que não teve a autorização da família Oliveira para ser feita, inocenta o casal Nardoni, condenado em março deste ano pela morte da menina, e diz que o assassino foi um pedófilo não identificado. O processo está em segredo.
O processo entregue na segunda-feira (24) no Fórum de Santana, na Zona Norte da capital, quer impedir a publicação, divulgação e comercialização da obra literária sob a justificativa de que ela agride a memória da menina morta aos 5 anos de idade e também causa constrangimento à sua mãe. Por telefone, a advogada de Ana Oliveira, Cristina Christo Leite, confirmou à reportagem ter entrado recentemente com uma ação, mas não quis dar mais detalhes sobre ela ou comentar o assunto.
Em 87 páginas, o livro de Sanguinetti discorda da decisão dos jurados. O casal Alexandre Nadoni e Anna Carolina Jatobá, respectivamente pai e madrasta de Isabella, foi condenado a mais de 30 anos de prisão pela morte da menina. Ambos dizem ser inocentes. O texto, critica o trabalho dos peritos e volta a reafirmar a existência de uma “terceira pessoa”, mas, desta vez, “revela” que o criminoso é, na verdade, um pedófilo, que abusou sexualmente da garota e a matou.
Procurado pela reportagem, Sanguinetti afirmou que vai esperar ser comunicado oficialmente pela Justiça para informar quais medidas irá tomar sobre a ação que quer barrar seu livro. O autor, no entanto, diz que não quis ofender nenhum familiar da menina.
“Ainda negocio o lançamento do livro com editoras, mas garanto que não há nenhuma alusão que denigra a imagem de Isabella ou sua família. Insistirei na publicação do livro e irei para qualquer tribunal. Estou fazendo o que meu país me permite: a liberdade de expressão. Responsabilizo-me pelo que escrevi. Fiz uma análise meramente técnica de um caso de grande repercussão. E reforço que não precisava pedir aturorização da família porque é um caso público”, declarou Sanguinetti, que já chegou a ser contratado pela família Nardoni para analisar os laudos periciais sobre a morte da menina.
Fotos de Isabella e boneca
Não é a primeira vez que Ana Oliveira entra com uma ação na Justiça contra um livro sobre o caso Isabella. Em junho de 2009, o gaúcho Paulo Papandreu, que também é médico, publicou “Isabella”, que apresentava outra explicação para a morte da garota: “acidente doméstico”. Segundo ele, a garota caiu sozinha do sexto andar do Edifício London, na Zona Norte de São Paulo.
O livro, que exibia uma foto de Isabella, não agradou a mãe da menina. Ela entrou com uma ação contra as imagens e o conteúdo da publicação. Em outubro, uma decisão judicial proibiu a venda e determinou o recolhimento dos 10 mil exemplares. O processo, no entanto, só será concluído após a sentença. Cerca de R$ 200 mil foram pedidos de indenização. Se a causa for ganha, a mãe de Isabella disse que doará o dinheiro a uma instituição de caridade.
Precaução
Ganhador do prêmio Jabuti de literatura de 1998 pelo livro “A Morte de PC Farias: O Dossiê de Sanguinetti”, o médico alagoano disse que ainda teve a preocupação de não exibir nenhuma foto de Isabella neste novo livro que trata do caso. “Me precavi. O primeiro passo foi o de não colocar nenhuma foto de Isabella, qualquer citação da família dela ou cópia de documento original do processo. Faço linguagem técnica a partir de achados. A polícia e a perícia deveriam ter investigado uma terceira pessoa”, disse.
“A morte de Isabella Nardoni - Erros e Contradições Periciais” contém fotos de uma boneca para representar a menina e desenhos feitos à mão de um suspeito, apontado como o pedófilo. O restante das páginas é de cópias de documentos de pareceres que Sanguinetti já fez sobre o caso.
“Sim, quem matou Isabella foi um pedófilo. As lesões encontradas no seu órgão genital são iguais a de uma criança abusada sexualmente. Ela caindo sentada, como afirmou a perícia paulista, não teria lesões como as que ficaram em seu corpo”, afirmou Sanguinetti. Os peritos dizem que as lesões na genitália são decorrentes da queda do sexto andar.
Leia abaixo o trecho do livro no qual ele tenta reproduzir como Isabella foi morta possivelmente por um pedófilo:
“A provável e talvez única motivação para o crime, para que ela fosse jogada do 6º andar do Edifício London foi desviar o foco do atentado sexual. Para que não fossem descobertas as lesões na genitália de Isabella e também impedir o reconhecimento do pedófilo. Acredito que a menor estava adormecida na cama, quando o infrator baixou a calça e a calcinha e a vulnerou com toques impúdicos, dedos, manuseios, etc. Ela acorda e grita papai...papai...papai e para...para..para, como foi descrito por testemunhas que ouviram os gritos de Isabella, audíveis até no 1º andar e no edifício vizinho. Os depoentes que ouviram os gritos, testemunharam que foram minutos antes da precipitação. Na tentativa de silenciá-la, de ocultar a tentativa de abuso sexual, a menor é jogada para a morte. Quando iniciei meus trabalhos, relatei meus primeiros achados e divulguei: ‘procurem o pedófilo, procurem o pedófilo,’ mostrando a causa real da morte de Isabella. No prédio ou nas cercanias, havia alguém com antecedentes de pedofilia? Os que trabalharam anteriormente foram investigados sob esta ótica? Repito: ‘Procurem o pedófilo! Procurem o pedófilo.’”, escreve Sanguinetti.
Isabella Nardoni morreu no dia 29 de março de 2008. Nardoni foi sentenciado a 31 anos, 1 mês e 10 dias; Jatobá, a 26 anos e 8 meses de prisão. Os dois estão presos em Tremembé, a 147 km da capital paulista. Eles sugerem que alguém entrou no apartamento enquanto Isabella dormia sozinha e a matou. Roberto Podval, advogado do casal, entrou com pedido na Justiça pedindo a anulação do júri. A solicitação será julgada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Caso seja negada, a defesa poderá recorrer a outras instâncias superiores, como o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.
Fonte: G1
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