Pesquisa avaliou como um peixe amazônico, o tambaqui, responde quando exposto simultaneamente a uma mistura de agrotóxicos e a um cenário extremo de mudanças climáticas, com temperaturas mais elevadas e maior concentração de gás carbônico na atmosfera.
Os quatro compostos utilizados no estudo (clorpirifós, malathion, carbendazim e atrazina) foram escolhidos por serem encontrados nos rios de áreas urbanas de Manaus, Belém, Santarém e Macapá.
Ficou demonstrado como a capacidade do tambaqui em metabolizar os agroquímicos é comprometida em águas mais quentes e com maior concentração de gás carbônico (CO2) na atmosfera; os danos podem atingir o fígado, o sistema nervoso e o DNA do animal.
A pesquisa aponta os riscos também à segurança alimentar da região, que encontra nos peixes sua principal fonte de proteínas; apenas em Manaus se consome cerca de 400 toneladas de tambaqui por ano.
Nos laboratórios do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), há um lugar informalmente chamado de “sala do futuro”. Nesta sala, é simulado um cenário de extremo de mudanças climáticas, conforme as projeções do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC: temperaturas cerca de 5 ºC mais quentes daquilo que é medido em tempo real, em Manaus, e maior concentração de CO2 na atmosfera (708 partes por milhão a mais, precisamente). Ali, a bióloga Samara Souza conduziu um experimento com tambaquis, expondo-os, para além dessas condições extenuantes, a uma mistura de agrotóxicos encontrados nas águas das proximidades da capital amazonense.
“Quando se fala em mudanças climáticas, o aumento das temperaturas não é o único elemento em que devemos prestar atenção”, explica Adalberto Val, coordenador do Instituto Nacional de Tecnologia (INCT-Adapta), onde a pesquisa foi conduzida. “Também devemos avaliar como a temperatura e a concentração de CO2 na atmosfera interagem com outros degradadores ambientais, como é o caso da poluição por agrotóxicos, formando sinergias perigosas.”
Especializada no efeito de contaminantes em peixes amazônicos, Samara já tinha uma compreensão madura de como diferentes agrotóxicos afetam os animais. Combiná-los a um cenário extremo de mudança climática é, para ela, uma maneira de compreender melhor o que ocorre nos habitats e quais desafios os organismos enfrentarão no futuro, na ausência de políticas que lidem com essas questões.
“Porém, é impossível recriar em laboratório tudo que ocorre no ambiente”, pondera Samara. “Podemos pensar inclusive que, no habitat, essas interações e seus efeitos podem ser mais negativos que as encontramos nos experimentos.”
Para o estudo, 36 tambaquis juvenis foram divididos entre um cenário que simula as condições atuais de temperatura e CO2, e o cenário extremo, sendo expostos a esses ambientes por 96 horas. Dos quatro agrotóxicos utilizados, dois (clorpirifós e malathion) são inseticidas, além de um herbicida (atrazina) e um fungicida (carbendazim), em concentrações semelhantes às encontradas nas águas das proximidades de Manaus.
Mesmo em concentrações abaixo do que é considerado letal para os peixes, a mistura dos compostos já traz impactos negativos aos tambaquis, como danos no fígado e efeitos adversos no sistema nervoso, que levam à paralisia e perda de funções. Porém, somado ao cenário climático extremo, alguns desses danos se exacerbam. Em outras palavras, em temperaturas mais altas, os peixes perdem a capacidade de metabolizar e se livrar desses compostos em seu corpo.
Isso se dá porque o aumento da temperatura ambiente de maneira tão aguda exige do peixe ajustes em seu metabolismo. As consequências disso são graves. Por exemplo, a contaminação por inseticidas organofosforados leva à inibição de uma enzima crucial na propagação de impulsos nervosos dos peixes, a acetilcolinesterase (AChE), e de outras enzimas que têm ação antioxidante nas brânquias.
Conforme explica Samara, “em contato com a água contaminada, os peixes que já estavam lidando com a temperatura alta e a maior concentração de CO2 ficam mais suscetíveis aos agrotóxicos por seu metabolismo não ter a resposta apropriada a eles, produzindo efeitos mais nocivos em comparação ao cenário atual de condições climáticas.”
Essa combinação produziu danos irreparáveis no fígado dos animais, além de danos também no DNA de suas células sanguíneas. “Os resultados demonstram que um futuro de mudanças climáticas combinado com pesticidas será prejudicial para os peixes da Amazônia, potencialmente levando à perda de biodiversidade”, conclui Samara.
Os efeitos de agrotóxicos nos peixes
Atualmente, o Brasil possui cerca de 4.455 agrotóxicos registrados para uso agrícola, segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), com usos e formulações diversas, que vão desde a lavoura até a pastagem. Desses, 1.017 são inseticidas organofosforados, a exemplo do clorpirifós e do malathion, utilizados na pesquisa com os tambaquis.
Diversas pesquisas têm se voltado ao efeito dos organofosforados em organismos aquáticos devido ao modo como esses compostos agem. Em insetos, a quem buscam eliminar, esses químicos atrapalham o bom funcionamento do controle do impulso nervoso, inibindo a produção da enzima acetilcolinesterase. “Isso coloca o sistema nervoso em curto, levando a uma paralisia muscular e à morte dos insetos”, explica Roberto Artoni, biólogo e geneticista da Universidade Federal de São Carlos.
Todavia, o composto não afeta apenas as pestes-alvo. Em contato com corpos d’água, esses organofosforados têm o mesmo efeito em peixes ou em insetos aquáticos. Artoni também é autor de pesquisas que testam esses efeitos em tambaquis, sobretudo de um outro organofosforado muito acessível no mercado, o triclorfon. “O composto leva o peixe a perder o equilíbrio. Dependendo da concentração, o animal passa a nadar de lado, com uma letargia que o impede de fugir de um predador ou de migrar em seu habitat natural”, explica. “Pouquíssimos peixes voltam quando expostos já a 50% da concentração considerada letal.”
Analisando tecido do fígado de tambaquis, Artoni e sua equipe também averiguaram como o triclorfon leva à morte celular, ativando genes relacionados à formação de tumores. “Usando o tambaqui como modelo, podemos presumir que, no ambiente, esses compostos também irão prejudicar a saúde de outros peixes, ou mesmo a insetos aquáticos, que fazem parte da cadeia alimentar dos rios. Em última instância, esses agroquímicos podem chegar a humanos, conforme são acumulados nos músculos dos peixes, levando a consequências igualmente relevantes à saúde”, explica Artoni.
Andreu conduziu uma avaliação da capacidade tóxica desses componentes na Amazônia a partir de dados já existentes sobre a letalidade dos compostos para diferentes espécies. Com isso, foi possível determinar como, próximos a essas cidades, as concentrações encontradas dos inseticidas clorpirifós e malathion são altamente perigosas para a biodiversidade aquática. Ao todo, 11 compostos foram detectados nas águas.
“Porém, usamos como referência espécies que já foram estudadas na literatura, sendo que não havia dados suficientes ainda para avaliar o risco especificamente de espécies amazônicas”, avalia Andreu. “Nos agrotóxicos que nós testamos, não achamos uma diferença significativa na sensibilidade entre peixes da Amazônia em comparação com peixes de outras regiões”.
O crescimento da população urbana na Amazônia gerou um aumento na demanda por comida, que passou a ser atendida por atividades agrícolas de pequeno porte ao redor das regiões metropolitanas. Segundo dados do MapBiomas, a área dedicada à agricultura aos arredores de Manaus saltou de 16 hectares, em 2004, para 197, em 2022.
Um artigo publicado pela The Royal Society of Biological Sciences, em 2013, demonstrou como o cultivo de frutas e vegetais não-nativos é responsável por um aumento do uso de agrotóxicos para combater pestes e competição com outras plantas. Uma vez no solo, os químicos se lixiviam e chegam aos rios com facilidade.
Todavia, os levantamentos sobre uso de pesticidas na região são feitos por universidades e centros de pesquisas, apenas. Atualmente, não há um acompanhamento oficial sobre esse crescimento. A falta de dados disfarça, inclusive, outros usos diversos desses compostos que ocorrem na região sem o devido controle ou fiscalização.
Por exemplo, a professora do Departamento de Parasitologia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Ana Gomes, explica como o triclorfon é utilizado para o combate de parasitas no cultivo de peixes, pela aquicultura da região. “Como este agroquímico não tem regulamentação para aplicação em animais aquáticos, seu uso na aquicultura é irregular. Também não há iniciativa por parte dos setores do governo da região em monitorar esses produtos na aquicultura”, explica.
Publicações científicas, como as do próprio Roberto Artoni, trazem relatos de piscicultores que expõem seus peixes a banhos de imersão com estes compostos, o que gera os efeitos negativos já mencionados nos próprios animais de cultivo. Os estudos evidenciam que organofosforados em peixes cultivados podem ficar até 15 dias nas vísceras do animal sob tratamento. Além disso, se não houver controle de entrada e saída da água neste cultivo, “a possibilidade desses compostos irem para os rios é muito relevante”, alerta Ana.
Procurada pela reportagem, a Associação Independente de Aquicultores do Estado do Amazonas não reconheceu o uso dos compostos citados na piscicultura do estado. Todavia, não há uma avaliação formal dessa utilização por parte da associação.
Agroquímicos no Brasil e suas alternativas
“O aumento da área agrícola explica apenas em parte o consumo de agroquímicos no Brasil”, defende o biólogo Charles dos Santos. Em 2018, Charles publicou um estudo com o levantamento que colocou o país como o maior consumidor de defensivos agrícolas no mundo, com um crescimento da demanda de 150% em 15 anos.
Embora esse acréscimo esteja diretamente relacionado à expansão da fronteira agrícola do país, Charles coloca como outro fator importante nesse aumento o uso inadequado desses compostos. “No temor de perder a produção, há uma tendência para se usar muito mais do que é recomendado, inclusive misturando compostos, para ter essa sensação de maior controle”, aponta Charles.
Todavia, esses agroquímicos tem uma alta persistência e alta mobilidade no meio ambiente. O herbicida atrazina utilizado na pesquisa de Samara, por exemplo, persiste até 100 dias na água antes de se dissolver completamente. Na Europa, a atrazina é banida já há 20 anos, à semelhança do clorpirifós, também proibido. Todavia, o Brasil continua sendo um mercado consumidor desses produtos cuja patentes sequer são nacionais.
Especificamente para a Amazônia, um cenário de mudanças climáticas somado aos efeitos destes compostos se apresenta como uma ameaça à segurança alimentar da região, que encontra nos peixes sua principal fonte de proteínas. Afinal, apenas em Manaus se consome cerca de 400 toneladas de tambaqui por ano. Além de risco à saúde, essa combinação também representaria perdas de produtividade na pesca e na aquicultura da região.
Por outro lado, o Brasil também é um mercado em potencial para alternativas aos agroquímicos. Por exemplo, Charles é um entusiasta do controle biológico nas lavouras, que consiste em introduzir uma espécie que preda a peste em questão até reduzir sua população ou eliminá-la.
“Mas há ainda outras alternativas como rotação de culturas e um manejo integrado de pragas até com drones”, complementa Charles. “As novas gerações de agricultores familiares precisam ter acesso ao que há de mais novo em ciência e tecnologia para reduzir o uso de agrotóxicos e até mesmo reduzir seus custos”.
Já na aquicultura, além da necessidade de haver controle na entrada e saída da água, também estão sendo desenvolvidas pesquisas no âmbito do Inpa e do INCT-Adapta para utilização da tecnologia de bioflocos. Trata-se do uso de microrganismos para a melhoria da qualidade da água nos sistemas de criação, levando a ganhos imunológicos nos animais e, consequentemente, reduzindo o uso de agroquímicos e outros medicamentos.
Incêndios recorrentes alteram a estrutura física, a diversidade e a composição das espécies, podendo levar a floresta ao colapso, mostra estudo
As florestas tropicais do mundo armazenam cerca de 460 bilhões de toneladas de carbono, o que representa quase metade do estoque terrestre total e as colocam em uma posição crucial na regulação do clima do planeta. Mas as queimadas cada vez mais intensas estão mudando este cenário. Estudo publicado esta semana na revista científica Environmental Research Letters mostra como o fogo modifica a estrutura da floresta e, em última instância, pode levar ao seu colapso, com impactos que vão além do local.
A pesquisa, realizada por cientistas de cinco diferentes instituições, revelou que a biomassa acima do solo diminuiu em 44% na floresta queimada uma vez, e 71% em porções florestais queimadas duas vezes. O dossel florestal foi o estrato mais afetado após o segundo incêndio, com uma redução de 44% em comparação com a floresta não queimada. O mesmo padrão de redução surgiu para a área basal – soma das áreas que os troncos das árvores ocupam na porção da floresta estudada –, que diminuiu em média 27,5% após o primeiro incêndio e em 53,8% após o segundo evento de incêndio.
No geral, as comunidades de plantas experimentaram uma perda de 50% da riqueza de espécies após dois incêndios, incluindo espécies dominantes e raras. As comunidades de plantas também se tornaram mais diferentes à medida que os eventos de incêndio se acumulavam, com diferença de até 61% nas espécies após dois eventos de incêndio.
O estudo foi realizado na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, localizada na região de Santarém, Amazônia Oriental, e considerou o impacto do fogo em árvores e palmeiras. Foram analisadas porções da reserva impactadas pelo fogo uma e duas vezes, nos incêndios de 2015 e 2017.
“A principal mensagem que trazemos com o estudo é o impacto que o fogo tem na floresta em termos de mudança de estrutura, considerando biomassa, área basal, carbono e composição florística. Todo mundo hoje fala de carbono, mas nós temos hoje uma grande parte da Amazônia degradada pelo fogo. Então, temos que olhar essa questão com preocupação, porque as florestas estão queimando e o fogo faz com que você tenha uma perda de até 71% de carbono”, explicou a ((o))eco Ima Célia Guimarães Vieira, pesquisadora titular do Museu Paraense Emílio Goeldi e uma das autoras do estudo.
O trabalho ressalta que as perturbações humanas na floresta – incluindo efeitos de borda e extração seletiva de madeira – abrem o dossel e permitem que os incêndios se propaguem. O fogo também atua como uma perturbação que promove mais incêndios. Florestas em regeneração, surgindo após incêndios florestais, frequentemente apresentam altas densidades de espécies pioneiras de rápido crescimento e demandantes de luz. Essa nova estrutura florestal tende a ser mais inflamável do que a floresta original não perturbada, tornando as florestas em regeneração mais vulneráveis a incêndios subsequentes e potencialmente criando um ciclo de feedback de degradação.
Foto: Reprodução
“Nossas descobertas destacam a necessidade urgente de garantir um futuro resiliente para as florestas amazônicas com ações necessárias para apoiar os meios de subsistência locais, ao mesmo tempo em que reduzimos a prevalência de fontes de ignição e permitimos a recuperação da floresta”, diz trecho do trabalho.
Segundo Vieira, o estudo sobre o impacto do fogo nas florestas, realizado com apoio do Instituto Clima e Sociedade (ICS), deve ser continuado, com aumento de amostragem para áreas que queimaram em três eventos de fogo.
Ministra participou hoje de audiência pública na Câmara dos Deputados
Em audiência pública na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, na Câmara dos Deputados, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, alertou nesta quarta-feira (16) sobre a importância de a iniciativa privada trabalhar junto aos governos federal, estadual e municipal na prevenção aos incêndios.
Segundo a ministra, é necessário que fazendas também mantenham estruturas preventivas e brigadas próprias para atuar nessas áreas.
“Se você tem uma farmácia, tem ali medidas e hidrantes para apagar o fogo. Da mesma forma, precisamos estar equipados onde não é possível estar o Corpo de Bombeiros”, afirmou, sobre o emprego de recursos públicos nos incêndios ocorridos em áreas privadas no estado de São Paulo. Marina ressaltou que foram enviados para o estado paulista brigadistas e uma aeronave da Força Aérea Brasileira, com alta capacidade de transporte de água e enfrentamento ao fogo, mas se esforços de prevenção também tivessem sido empregados, os equipamentos poderiam ser melhor direcionados para áreas públicas federais, que são de fato responsabilidade da União.
“São Paulo é, de longe, o estado mais rico, de longe o estado que tem maior capacidade de infraestrutura: são mais de 8 mil pessoas no Corpo de Bombeiros, chegando a quase 9 mil. A iniciativa privada tem brigadistas que são treinados para cuidar de suas propriedades”, destacou.
Por outro lado, segundo a ministra, há estados e regiões onde o poder público ainda não tem essa capacidade de enfrentamento a incêndios florestais. Nesses casos, o governo federal entra, para além daquilo que é sua responsabilidade. "No caso do Pantanal, isso é notório. O maior contingente era nosso, a maior quantidade de equipamento também”, afirmou.
De acordo com Marina, quase 900 pessoas atuam no Pantanal. Na Amazônia, embora 60% do território seja de área pública federal, o governo federal atua em mais de 70% da região, enfrentando os incêndios florestais.
“O governo federal tem trabalhado, não só em parceria com os estados, mas também com a iniciativa privada, inclusive ajudando a iniciativa privada. Porque diferentemente de São Paulo, Rio e Minas, que são estados com maior condição em termos econômicos, a maioria não tem essas estruturas”, disse.
FINANCIAMENTO
A ministra lembrou que foram destinados do Fundo da Amazônia mais de R$ 400 milhões para equipar o Corpo de Bombeiros nos estados, mas que isso é insuficiente. "Também é necessário que a iniciativa privada tenha um programa estruturado de enfrentamento ao fogo."
Marina sugeriu que o Banco da Amazônia poderia ter uma linha de crédito de financiamento com juros mais reduzidos para que empresas fiquem, "devidamente equipadas" para esse enfrentamento.
CRIME
Por outro lado, a ministra afirmou que todo o esforço preventivo e de enfrentamento não será suficiente se o fogo por ação humana não acabar, seja se origem culposa, sem intenção, ou dolosa, “quando se tem a intenção deliberada de queimar”.
“No caso de São Paulo, os incêndios começaram 10h45 da manhã. À uma da tarde, 17 municípios já estavam pegando fogo. Em mais de 300 cidades foi ateado fogo e mais de 26 pessoas foram presas, porque o faziam de forma criminosa”, afirmou.
Em São Félix do Xingú, no Pará, um jornal local publicou declarações de pessoas insatisfeitas com a desocupação de uma unidade de conservação. Por eeste motivo, ameaçavam incendiar o local.
CORTE ORÇAMENTÁRIO
A ministra destacou ainda que, mesmo com a antecipação das ações pelo governo federal, e com a recuperação de 37% no orçamento da pasta - após cortes de R$ 18,4 milhões - continua sendo necessário a incrementação constante de ações e de recursos públicos, que poderiam ser economizados com prevenção compartilhada.
“Obviamente que precisamos ampliar os recursos, mas o que nós precisamos mesmo é que as pessoas não coloquem fogo. Senão vamos ficar simplesmente pegando dinheiro público e utilizando para algo que preventivamente se poderia fazer, o recurso nunca será suficiente.”
Dados de satélite que mostram o avanço verdejante sobre o solo da península foram apresentados recentemente em artigo na revista científica Nature Geoscience
As áreas colonizadas por vegetação estão aumentando cada vez mais rápido na península Antártica, a área do continente gelado mais próxima das demais massas de terra do planeta. A mudança é fruto do impacto da crise climática sobre a Antártida, com repercussões imprevisíveis sobre os ecossistemas da região.
Dados de satélite que mostram o avanço verdejante sobre o solo da península foram apresentados recentemente em artigo na revista científica Nature Geoscience.
As informações de sensoriamento remoto indicam que as áreas cobertas por vegetação ali passaram de um total de 0,86 km2 em 1986 para 12 km2 nesta década.Em termos absolutos, ainda é muito pouco, mas os dados indicam que o ritmo desse avanço está se acelerando, chegando a quase meio quilômetro por ano. A rigor, a aceleração não destoa de outras tendências de transformação em território antártico trazidas pelo aumento da temperatura global.
Conforme explica a equipe liderada por Thomas Roland, da Universidade de Exeter (Reino Unido), o processo está intimamente ligado à perda de massa de 90% das geleiras da península, o que também corresponde ao aumento das áreas com solo livre de gelo da região, que podem triplicar ao fim deste século.
Faz sentido que essas mudanças mais radicais afetem primeiro o trecho peninsular da Antártida porque a área tem mais contato com as correntes marinhas que fluem pelos diferentes oceanos do planeta, além de estar mais próxima da extremidade meridional de continentes como a América do Sul. Parece haver uma correlação, por exemplo, entre o avanço das áreas verdes e a diminuição do gelo marinho antártico.
Tais alterações favorecem principalmente o crescimento dos musgos nativos da península, embora também impulsionem a colonização do solo por plantas mais complexas. Já há dados mostrando que as camadas de musgo estão ficando mais espessas na península Antártica, mas os pesquisadores queriam investigar até que ponto elas também estão se espalhando lateralmente.Os dados de satélite confirmaram essa expansão “para os lados”. Revelaram ainda que ela está acontecendo principalmente em áreas “pioneiras”, em que antes não se encontrava vegetação nenhuma.
Um dos mecanismos que talvez explique isso seja o aumento do número de dias do ano com temperatura favorável ao crescimento das plantas, embora essa hipótese ainda careça de comprovação. Ao que tudo indica, o processo também afeta preferencialmente certas áreas da península: devido à presença de elevações e outros fatores, certas áreas são mais quentes e recebem mais chuva, e é nelas que os musgos avançam mais rápido.
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O avanço dessas plantas tem outra repercussão importante: por conseguirem crescer em áreas rochosas, sua presença é capaz de produzir novos solos com o passar do tempo. Ou seja, elas podem abrir caminho para o estabelecimento posterior de plantas cujo crescimento exige mais do substrato debaixo delas, modificando ainda mais um ambiente que antes era apenas pedregoso e coberto periodicamente por neve e gelo. Esse tipo de mudança poderia inclusive facilitar a vida de espécies invasoras trazidas de outros continentes, favorecendo seu estabelecimento definitivo por lá.
Por fim, outra repercussão possível do processo é conectar ambientes da península Antártica que hoje estão separados por obstáculos naturais (como as próprias geleiras). Um tapete mais contínuo de musgos eliminaria as antigas diferenças entre esses habitats e poderia homogeneizar a biodiversidade da região como um todo.
A mínima anterior, registrada em 1964, foi de 61 centímetros abaixo da cota
O Rio Paraguai chegou ao seu nível mais baixo já medido, segundo o Serviço Geológico Brasileiro (SGB), atingindo a marca de 62 centímetros abaixo da cota de referência. A série de medições foi iniciada pela Marinha em 1900, no posto de Ladário, junto à cidade de Corumbá (MS), na fronteira com Porto Quijarro (Bolívia). A mínima anterior, registrada em 1964, foi de 61 centímetros abaixo da cota.
A cota padrão é de 5 metros (m) de profundidade média, segundo o Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), que já havia feito um alerta sobre o menor nível histórico do rio na última quarta-feira (9), a partir de medições próprias. A estação serve como referência para a Marinha na análise das condições para navegação e definição de medidas de restrições.
O Rio Paraguai corre pelos estados de Mato Grosso, onde nasce, e Mato Grosso do Sul, de onde segue para o Paraguai e a Argentina. Suas nascentes são alimentadas por águas que vêm da Amazônia, como as do Rio Negro. A região também passa por seca histórica. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA) a Região Hidrográfica Paraguai ocupa 4,3% do território brasileiro, abrangendo parte dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, o que inclui a maior parte do Pantanal mato-grossense, a maior área úmida contínua do planeta.
Para o SGB, a situação era esperada desde fevereiro, quando os pesquisadores alertaram sobre a possibilidade de se chegar a uma mínima histórica na região. “Essa seca vem sendo observada em razão das chuvas abaixo do normal durante toda estação chuvosa, desde outubro de 2023. Por isso, temos alertado sobre esse processo que se desenhava na bacia”, explica o pesquisador Marcus Suassuna na nota da instituição.
Segundo o Imasul, a queda no nível do Paraguai tem implicações diretas para a economia e para o meio ambiente, afetando turismo e pesca, além do abastecimento de comunidades ribeirinhas. ˜Especialistas associam essa redução drástica à variabilidade climática e à escassez de chuvas na bacia hidrográfica. O Pantanal, um dos biomas mais frágeis e importantes do planeta, está particularmente vulnerável a essas mudanças, que afetam tanto a biodiversidade quanto as comunidades humanas”, destaca o instituto em nota.
RECUPERAÇÃO LENTA
De acordo com as projeções do SGB, a recuperação dos níveis na Bacia do Rio Paraguai será lenta. O nível em Ladário (MS) deve ficar abaixo da cota até a segunda quinzena de novembro. “Observamos que o ritmo de descida do rio tem diminuído consideravelmente e estava estabilizado desde a última segunda-feira (7) em razão dessas primeiras chuvas da estação chuvosa. As precipitações devem continuar, mas não em ritmo muito forte que vá contribuir para subidas rápidas neste trecho e em toda a bacia”, analisa Suassuna na nota.
A década tem sido marcada por estações chuvosas insuficientes para a recuperação das reservas. Segundo o SGB, durante a estação chuvosa iniciada em outubro de 2023, foi registrado um déficit acumulado de 395 (milímetros) mm de chuvas. O total estimado foi de 702 mm, enquanto a média esperada seria de 1.097 mm. Na década, considerando o acumulado de 2020 a 2024, o déficit foi de aproximadamente 1.020 mm, valor equivalente ao total de um ano hidrológico.
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Ainda segundo o relatório do SGB, na última semana, a Bacia do Rio Paraguai registrou um volume de chuvas de 3 mm. Os rios da região apresentam níveis abaixo do normal para este período do ano, com exceção do Rio Cuiabá, que apresenta nível dentro do esperado. A situação do Rio Cuiabá, porém, deve-se à regularização das vazões ocasionada pela operação da Usina Hidrelétrica de Manso.
Em Barra do Bugres e Porto Murtinho, o Rio Paraguai alcançou o nível mais baixo do histórico de toda a série de monitoramento das estações. O estudo explica que as projeções utilizadas indicam acumulados de chuva de 27 mm nas próximas semanas, levando ao início da recuperação dos níveis em Cáceres, Ladário, Forte Coimbra e Porto Murtinho, além da estabilização em outros locais.
Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), considerando a estimativa para a Energia Natural Afluente (ENA), a Região Sul deve atingir com 86% da Média de Longo Termo (MLT). A medida indica a capacidade dos sistemas hidrelétricos de geração. Para as demais regiões, os índices são os seguintes: Norte, com 49% da MLT; Sudeste/Centro-Oeste, com 45%; e Nordeste, com 34%.
RISCOS À NAVEGAÇÃO
A Marinha mantém uma série de alertas para o Rio Paraguai, boa parte indicando piora nas condições de navegação. Em um deles, afirma a necessidade de precaução de segurança. “Em virtude do rígido regime de seca observado no Rio Paraguai e o consequente afloramento de bancos de areia e rochas, os navegantes devem redobrar a atenção, fazendo uso da carta náutica em vigor, atentando para o balizamento e mantendo uma velocidade segura.”
Além disso, antes de iniciar a navegação, devem consultar o boletim diário de avisos-rádio náuticos disponível no site do Centro de Hidrografia e Navegação do Oeste, a fim de verificar a diferença entre o nível do rio e o nível de referência da carta náutica (nr), eventuais alterações no balizamento e outros avisos para segurança do navegante.
A região tem trânsito constante de barcos desde ao menos o século 18, estabelecendo importante corredor de integração com os países vizinhos. Hoje é uma das seis hidrovias cuja licitação para concessão à iniciativa privada está estabelecida como prioridade pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), junto com as hidrovias Madeira, Tapajós, Tocantins, Lagoa Mirim e Barra Norte. O projeto visa acelerar o transporte de cargas, especialmente de produção agrícola e mineral, para beneficiamento e exportação, o que deve favorecer o aumento da exploração desses itens na região, atividades que levam ao aumento do consumo de água.