Mesmo proibida e ilegal, a maconha é uma droga que circula no Brasil e tem o consumo associado a momentos de lazer. No carnaval, não é raro encontrar adeptos que, além de estarem dispostos a enfrentar possíveis punições caso sejam flagrados com a substância, correm o risco de potencializar efeitos negativos na saúde (e no convívio social) misturando a maconha com o álcool.
Em três pontos, especialistas concordam que, quando há o consumo excessivo das duas substâncias: o álcool potencializa a absorção do principal princípio ativo da maconha; o consumo excessivo pode causar náuseas, vômitos e desmaios; e alteração da coordenação motora e das funções cognitivas.
A Lei Antidrogas de 2006 permite que uma pessoa seja presa pela posse da substância. No entanto, atualmente a erva vem sendo amplamente usada de forma recreativa no mundo todo, enquanto estudos científicos buscam explorar os potenciais dos derivados da cannabis para a saúde.
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Segundo a ONU, mais de 200 milhões de pessoas entre 15 e 64 anos fizeram o uso da cannabis em 2020. Esse número representa uma taxa de aumento de 23% em relação aos 170 milhões de pessoas que usaram a droga para o mesmo fim uma década antes. No Brasil, a maconha é a substância ilícita mais consumida. Segundo dados da Fiocruz de 2019, 7,7% dos brasileiros de 12 a 65 anos já usaram maconha ao menos uma vez na vida.
ÁLCOOL+MACONHA: MAIS THC NO SANGUE
De modo geral, o uso associado do álcool com a maconha está relacionado a consequências mais prejudiciais ao organismo do que o uso isolado dessas substâncias. Tércio Sousa, clínico geral e especialista em medicina endocanabinoide, explica que isso ocorre porque quando a cannabis e o álcool são combinados, a cannabis pode ter um efeito mais forte no organismo, já que o álcool aumenta significativamente os níveis de THC no sangue. Essa associação, inclusive, foi comprovada em um estudo de 2015 publicado na revista científica Clinical Chemistry.
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Na época, pesquisadores realizaram um experimento com um grupo pequeno de pessoas e as fizeram beber álcool, em doses baixas, ou um placebo dez minutos antes delas inalarem cannabis vaporizada. Depois disso, eles constataram que quando o álcool foi de fato consumido, uma concentração sanguínea muito maior de THC foi observada. "O álcool e a cannabis competem pela mesma via metabólica. Isso é, eles são metabolizados no mesmo local: o fígado. Por isso, quando você está ingerindo álcool e usa a cannabis, o índice de THC fica mais elevado que o normal", diz Tércio.
Segundo o CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças), vários fatores determinam como a maconha afeta o nosso organismo, incluindo: a quantidade de maconha consumida; a frequência de uso; o gênero da pessoa (por exemplo, as mulheres podem sentir mais tonturas que os homens); se o uso é associado com outras substâncias (além do álcool, drogas como a cocaína); o modo de uso de maconha (por exemplo, produtos com alta concentração de THC podem aumentar o risco de overdose); se a pessoa teve uma experiência anterior com a maconha ou outras drogas; e até mesmo questões genéticas. Por causa desses fatores, é preciso ter em mente que múltiplos efeitos colaterais estão associados ao uso simultâneo com o álcool e que eles podem se manifestar de forma diferente.
Quando a cannabis é consumida pelo fumo, por exemplo, Tércio explica que os níveis de THC já são muito altos, independentemente se ela foi ou não associada à ingestão de bebidas alcóolicas. "Quem fuma recreativamente, ainda mais em festas e no carnaval, por exemplo, tem a intenção de 'enlouquecer' e isso é que o problema, porque resulta em efeitos adversos indesejáveis que podem terminar mais cedo o carnaval de muita gente", diz. Além disso, no caso das mulheres, o médico ressalta que diversos estudos indicam que elas possuem uma maior sensibilidade ao THC e que, por isso, estão mais suscetíveis a efeitos colaterais negativos da maconha.
QUAIS AS REAÇÕES MAIS COMUNS DO CONSUMO ABUSIVO?
Segundo especialistas ouvidos pelo g1, as reações mais comuns (em ambos os gêneros) associadas ao consumo excessivo combinado das duas substâncias são:vertigens; desmaios; quadros de ansiedade (isso porque o THC em altas doses é capaz de induzir a ansiedade) e de síndrome do pânico; náuseas e vômitos; uma frequência cardíaca acelerada; reações mais lentas e percepções alteradas; e problemas respiratórios (por causa da queima de substâncias tóxicas quando a maconha recreativa é fumada). "A combinação dos dois prejudica bastante as nossas funções cognitivas", afirma Henrique Bottura, diretor clínico do Instituto de Psiquiatria Paulista.

"Tanto o álcool quanto a maconha têm aquele efeito modulador de ansiedade de início, mas posteriormente vemos um aumento de ansiedade depois. Em geral, as pessoas acham que estão usando para relaxar, mas depois vem essa ansiedade rebote tanto no álcool quanto na maconha. E quando os dois são combinados isso é potencializado ainda mais".

RISCO PARA JOVENS E GESTANTES É MAIOR
Segundo a ONU, mais de 200 milhões de pessoas entre 15 e 64 anos fizeram o uso da cannabis recreativa em 2020. Esse número representa uma taxa de aumento de 23% em relação aos 170 milhões de pessoas que usaram a droga para o mesmo fim uma década antes. E os jovens continuam formando o principal grupo de usuários.

Ainda de acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas da organização, há uma maior prevalência de uso de maconha entre adolescentes do que em toda a população na chamada idade produtiva (entre 15 e 64 anos). O problema é que o uso recreativo (ou disfuncional, como alguns pesquisadores gostam de chamar) é bastante prejudicial nessa idade.
Segundo o CDC, o uso de maconha antes dos 18 anos pode afetar inclusive funções de aprendizado, memória e atenção para o resto da vida. Isso ocorre porque nessa idade (e até os 25 anos), o nosso cérebro ainda está em desenvolvimento. Por causa disso, os jovens são mais vulneráveis aos efeitos negativos da cannabis.E nos adolescentes, os mais comuns são: uma maior dificuldade em pensar e resolver problemas;
problemas de memória; uma redução da coordenação motora; uma maior dificuldade em manter a atenção; e até mesmo problemas com a escola e a vida social. Aliado a tudo isso, misturar maconha e álcool também potencializa os efeitos adversos em jovens adultos.
Um estudo americano de 2021 constatou inclusive que estudantes universitários que usaram maconha e álcool simultaneamente experimentaram mais consequências negativas do que aqueles que usaram as duas substâncias isoladamente.Na pesquisa, que ouviu mais de mil estudantes com idades entre 18 e 24 anos, foi observado que todos os efeitos negativos (como quadros de vômito, problemas cognitivos, desmaios etc.) foram mais comuns quando o uso da maconha foi associado ao álcool. Já no caso de mulheres grávidas e em período de amamentação, Tércio explica que os riscos também são semelhantes para a saúde do bebê.

Algumas pesquisas mostram até que o uso de maconha durante a gravidez pode causar problemas de saúde que vão desde um baixo peso ao nascimento até um desenvolvimento neurológico anormal.Além disso, o uso da maconha a longo prazo (cronicamente) pode levar a um risco aumentado de acidente vascular cerebral, doenças cardíacas e outras doenças vasculares.
REDUÇÃO DE DANOS E COMO EVITAR RISCOS?
A aposta mais segura é evitar o uso de maconha e álcool juntos, asseguram os especialistas.No caso específico da maconha, o fato de o uso recreativo não ser permitido no Brasil é outro motivo de alerta, pois diversas substâncias tóxicas podem ser adicionadas no processo de tráfico.Por isso, como lembra o especialista em medicina endocanabinoide, Tércio Sousa, é preciso redobrar os cuidados quanto ao uso."A cannabis recreativa é proibida no Brasil, mas ao mesmo tempo a gente sabe que tem em toda esquina e que muita gente usa tanto no carnaval, como em shows, a gente pode ver fartamente o uso. Por isso, eu acho que o que faz a diferença nessas horas é a gente difundir o autoconhecimento sobre riscos. A pessoa precisa conhecer seus limites e não os exceder", diz o médico.As principais dicas elencadas pelo especialista são:
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Fotos:Reprodução
Beba bastante água: o álcool desidrata o corpo. Assim, o volume sanguíneo aumenta junto com a concentração de substâncias como o THC.
Coma bem: o álcool entra na corrente sanguínea através do estômago. Por isso, a comida impede que o álcool seja absorvido rapidamente. Não dirija após o uso: O THC no corpo pode diminuir o tempo de reação do motorista e causar acidentes; Não consuma uma quantidade elevada em pouco tempo: o uso elevado da cannabis recreativa em pouco tempo pode potencializar ainda mais seus efeitos indesejáveis; Evite tomar medicamentos: a mistura pode causar efeitos imprevisíveis.
Tudo gira em torno do bom senso. Uma coisa que eu sempre digo para meus pacientes que usam álcool ou maconha é que, se eles gostam de usar e querem usar a vida inteira, que usem pouco e comedidamente, para isso não fazer nenhum mal".
Fonte:G1
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