Mais elevada a temperatura, maior a frequência de incêndios florestais, chuvas torrenciais e secas. Tudo isso contribuiu para seca histórica que atingiu os rios da Amazônia no final de 2023.
Com informações do Greenpeace
Do ano mais quente já registrado – 2023 – para o Janeiro mais quente de todos os tempos, segundo o observatório europeu Copernicus (a marca anterior era Janeiro de 2020), 2024 começou como o ano passado terminou: com temperaturas recordes e muitos eventos extremos no Brasil e em várias partes do planeta. E o problema fica pior ainda segundo um alerta do órgão meteorológico norte americano (NOAA) de que 2024 poderá bater um novo recorde de temperatura global.
Quanto mais elevada for a temperatura, maior será a frequência e intensidade de incêndios florestais, chuvas torrenciais, secas e, com elas, tragédias humanas como as que temos visto nos incêndios do Chile em fevereiro, nos alagamentos na Califórnia em janeiro, nas enchentes no Rio de Janeiro e no sul do Brasil em janeiro, e na seca histórica que atingiu os rios da Amazônia no final de 2023.
Queimada em desmatamento recente na Gleba Abelhas, uma floresta pública não destinada federal localizada no município de Canutama, Amazonas. Foto: Divulgação/Greenpeace
Colocando o problema em outra perspectiva, uma conta rápida mostra enquanto o mundo vem quebrando recordes de temperaturas desde 2020, na prática, os últimos cinco anos registraram os três incêndios florestais mais mortais do século:
Na Austrália, no final de 2019, quando incêndios queimaram 115 mil km² de matas e florestas, mataram 30 pessoas morreram e mataram ou desalojaram quase 3 bilhões de animais;
No Havaí, em agosto de 2023, onde pelo menos 100 pessoas morreram e milhares perderam suas casas;
No Chile, em fevereiro, onde, até onde se sabe, 131 pessoas morreram e 300 seguem desaparecidas.
Por falar em incêndios florestais, o Monitor Global de Fogo, do serviço de meteorologia da União Europeia Copernicus, mostra os focos de calor ativos nas últimas 24 horas no mundo e a imagem é clara: cerca da metade do planeta têm focos de calor neste momento.
Focos de calor ativos no mundo em 7 de fevereiro de 2024, segundo o serviço Monitor Global do Fogo, do serviço europeu Copernicus.
Os cientistas explicam que todo esse calor seguido por eventos extremos foi potencializado pelo fenômeno do El Niño, que aquece as águas do Oceano Pacífico e eleva as temperaturas, mas também são muito claros ao afirmar que o calor extremo é resultado da atividade humana, como a queima de petróleo, gás e carvão e o desmatamento de florestas.
Ou seja, nunca foi tão urgente zerar o desmatamento em florestas tropicais como a Amazônia e colocar um fim na era dos combustíveis fósseis. Sem essas mudanças, o mundo ficará cada vez mais quente.
Alerta para queimadas na Amazônia em 2024
Por aqui, no Brasil, vemos a Amazônia arder em chamas devido a uma combinação de tempo seco e quente (intensificado pelo El Niño, fenômeno que deve durar até a primavera) com crimes ambientais (que vão de desmatamento a abertura ou "limpeza" de áreas de pastagens). Em janeiro de 2024, os focos de calor registrados na Amazônia tiveram um aumento de 85% em relação ao mesmo período do ano passado.
Em um país enorme territorialmente como o Brasil, não são "apenas" fogo e seca motivos de preocupação, mas também as chuvas extremas.
Cerca de 9,5 milhões de brasileiros moram em áreas de risco sujeitas a deslizamentos de terra, enchentes e outros desastres climáticos, segundo o Cemaden, o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais.
Mesmo com esse dado alarmante e a previsão de que a crise climática se intensificará este ano, o Brasil não está preparado para eventos extremos cada vez mais frequentes. Precisamos de medidas que saiam do papel e se antecipem às tragédias, com políticas públicas que coloquem a população que mais sofre com os efeitos das mudanças no clima como prioridade. É inaceitável que as pessoas sigam perdendo suas casas e suas vidas.
"Eventos climáticos extremos estão acontecendo no Brasil inteiro. Além das fortes chuvas, há regiões em que as pessoas estão sofrendo com estiagem, seca, altas e baixas temperaturas com características para além do normal. Isso precisa ser enfrentado com políticas públicas por meio de medidas de prevenção, adaptação e respostas aos eventos extremos. Essas ações precisam ser direcionadas principalmente para as pessoas que têm sido mais impactadas, que são majoritariamente as populações negras, indígenas, as mulheres, as crianças e os idosos", disse Igor Travassos, porta-voz da frente de Justiça Climática do Greenpeace Brasil.
Açaí é a espécie mais importante da região e seu cultivo corresponde a 92% do montante associado à polinização.
COM INFORMAÇÕES DA AGÊNCIA BORI
Há pouco tempo, especialistas acreditavam que as palmeiras eram polinizadas principalmente pelo vento. Descobertas recentes mostram, no entanto, que a polinização dessas plantas, que resulta na produção dos frutos, depende de insetos como abelhas e besouros. Segundo estudo da Universidade Federal do Pará (UFPA) e do Instituto Tecnológico Vale (ITV) publicado nesta quarta (14) na revista científica "Arthropod-Plant Interactions", o valor monetário do serviço feito por polinizadores na produção dos frutos das palmeiras da região amazônica chega a R$ 706 milhões por ano.
O açaí se destaca como cultura que depende de polinizadores para produção de frutos. Segundo as análises, 92% do valor monetário do serviço de polinização deriva desta produção agrícola, que tem predominância no estado do Pará.
A estimativa do valor da polinização foi feita por meio de análise de dados do Censo Agropecuário de 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A análise apontou que o valor de produção de treze espécies de palmeiras da Amazônia Legal é equivalente a R$1,17 bilhões por ano. Cerca de 85% desse valor equivale à produção de açaí.
92% do valor monetário da polinização de abelhas e besouros deriva do açaí; cultura tem predominância no estado do Pará. Foto: Izaque Pinheiro/Embrapa Imagens
Algumas espécies analisadas dependem mais e outras menos do serviço de polinização, mas 60% do valor de produção agrícola das palmeiras vem do trabalho de polinizadores. No processo, os insetos transportam grãos de pólen de uma flor para outra, garantindo a produção dos frutos pelas plantas e a sobrevivência de outros insetos que se alimentam nas flores. Cerca de 61% dos valores da polinização estão associados exclusivamente à produção de frutos de palmeiras advindos de áreas de florestas.
"As palmeiras são muito importantes para as comunidades tradicionais que, muitas vezes, são extrativistas, ou seja, entram na floresta e coletam frutos, fibras e amêndoas", aponta Tereza Cristina Giannini, pesquisadora do ITV e uma das autoras do estudo. "Por isso, esses valores que levantamos provavelmente estão subvalorizados",
observa.
O cálculo chama a atenção para o valor dos polinizadores e de sua preservação. "Eles têm uma importância econômica muito grande, e é mais fácil compreender esses serviços prestados principalmente por insetos para a produção de alimentos a partir de cifras monetárias", diz Giannini. Entre os principais polinizadores das palmeiras amazônicas estão as abelhas e os besouros. Estes últimos, segundo os cientistas, merecem atenção. "As abelhas são campeãs na polinização, todo mundo sabe, mas os besouros são particularmente importantes para as palmeiras", afirma William de Oliveira Sabino, pesquisador do ITV e coautor da pesquisa.
Os efeitos das mudanças climáticas sobre os polinizadores são um tema de preocupação para os cientistas. "Existe um ciclo de dependência entre as pessoas e a floresta que, por sua vez, depende de polinizadores para continuar existindo. Então, aquilo que afeta o habitat natural dos animais pode afetar, consequentemente, a produção agrícola", explica Sabino. O pesquisador defende que é preciso pensar em soluções para preservar os processos de polinização na região Amazônica diante das mudanças ambientais.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Agência Bori
Após dias de instabilidade climática, a previsão é de continuidade da chuva ao longo do fim de semana em todo o Brasil. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), os maiores volumes de chuva devem ser registrados no Sudeste, especialmente entre o litoral norte de São Paulo e a Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
Essa condição meteorológica é resultado de um ciclone subtropical que está se intensificando em alto-mar. Maria Clara Sassaki, porta-voz da Climatempo, explica que o ciclone ganhará força na sexta-feira (16) antes de se afastar do continente.
Sassaki ainda esclarece que esse fenômeno não está associado a uma frente fria, mas sim à agitação atmosférica causada pela passagem de uma frente fria pelo Sudeste. A força do ciclone é potencializada pelas águas quentes do Oceano Atlântico próximo ao continente.
O INMET emitiu um alerta de “perigo” devido às fortes tempestades previstas para o Sudeste, abrangendo o oeste do Paraná, leste do Mato Grosso do Sul, sul de Goiás e a maioria dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Nessas regiões, as chuvas podem atingir até 100 milímetros por dia, acompanhadas de ventos intensos de até 100 km/h.
A relação sexual se enquadra como um exercício leve que tem efeitos positivos para o coração, a mente e até o sistema imunológico
Uma vida sexual ativa, quando devidamente acompanhada do uso de preservativos, pode trazer uma série de benefícios para a saúde. Isso porque, embora não seja considerada uma atividade física completa, a relação sexual se enquadra como um exercício leve que, com uma certa frequência, leva a efeitos positivos para o coração, a mente e até o sistema imunológico.
Em um artigo publicado no site de divulgação científica The Conversation, o gerontologista (especialista em envelhecimento) espanhol Joaquín Mateu Mollá defende que a atividade sexual traz ao menos cinco benefícios a quem a pratica com frequência, entre eles: a redução do estresse e a melhora no sistema imunológico. Confira:
Ao fazer sexo, o cérebro produz endorfinas, substâncias que geram excitação, satisfação e bem-estar. Eles também estão envolvidos na euforia e na calma que precede e segue o orgasmo, respectivamente. Assim, estão incorporados na resposta de recompensa que experimentamos ao sentir diferentes formas de prazer.
“Embora nos faça sentir bem, não se pode dizer que o sexo sirva como tratamento antidepressivo. Pode nos proporcionar momentos positivos que se somam a outros para potencializar emoções agradáveis, mas os transtornos de humor exigem abordagens terapêuticas muito mais complexas e muitas vezes multidisciplinares”, afirma o pesquisador.
O sexo também tem um efeito positivo na insônia que muitas vezes acompanha os problemas de saúde mental.
REDUZ O ESTRESSE
Quando convivemos muito tempo com situações que nos sobrecarregam, a frequência com que queremos fazer sexo diminui, o que às vezes pode se traduzir em menos satisfação com nosso parceiro.
Isto pode ser devido aos níveis de cortisol, um hormônio necessário para lidar com as demandas ambientais e sociais, mas prejudicial quando sua concentração no corpo aumenta muito ou por muito tempo.
Nesse sentido, o sexo pode ajudar a reduzir o estresse associado a sobrecarga diária.
“Um fato curioso nesse sentido é que os casais mais satisfeitos tendem a buscar relações sexuais nos dias seguintes a um dia estressante. Além disso, são também os que mais beneficiam dos seus efeitos positivos”, explica Mollá.
MELHORA O SISTEMA IMUNOLÓGICO
A atividade sexual regular aumenta as nossas defesas fisiológicas contra vírus, bactérias e outros agentes patogênicos. Existem até estudos que sugerem que ter relações íntimas três vezes por mês pode nos proteger do coronavírus.
especialistas da Universidade de Baghdad, no Iraque, conduziram uma pesquisa com 16 mil participantes em 33 países, divididos em dois grupos. O primeiro mantinha uma frequência de ao menos três relações sexuais por mês, enquanto o segundo grupo tinha uma atividade sexual menor. Ao fim de um período de quatro meses, foi observado que 76,6% dos participantes do primeiro grupo não foram infectados pela doença, enquanto o percentual foi de 40,4% nos demais participantes.
Este benefício no sistema imunitário é independente da idade e de práticas sexuais específicas, pelo que qualquer pessoa pode alcançá-lo em diferentes momentos da sua vida. Resumindo: as evidências sugerem que à medida que aumentamos a frequência das relações sexuais o nosso sistema imunitário se torna mais competente contra ameaças.
REDUZ A PRESSÃO ARTERIAL E A DOR
A atividade sexual promove a saúde cardiovascular. Sabemos que os jogos eróticos a dois aumentam a pressão sistólica e diastólica, com um pico durante o orgasmo que atenua à medida que desaparece.
Um estudo recente sugere que a manutenção da atividade sexual durante a velhice reduz a probabilidade de problemas cardiovasculares, afetando positivamente fatores de risco conhecidos. Também pode contribuir para o alívio da dor nas patologias que a causam, existindo muitos dados sobre este ponto, principalmente na população feminina.
FORTALECE O RELACIONAMENTO E A CONEXÃO EMOCIONAL
“O sexo é importante para construir e manter o vínculo com o parceiro, pois é um espaço propício à partilha de experiências gratificantes. Isso está ligado à produção de oxitocina, hormônio que contribui para o fortalecimento de todos os tipos de relacionamento (inclusive entre mãe e filho durante a amamentação)’, diz o pesquisador.
Fotos: Reprodução
A oxitocina ajuda a regular os comportamentos sociais e emocionais, tornando-a fundamental para o bem-estar. Também modula as respostas de medo, ansiedade e estresse. Florescendo especialmente em momentos íntimos como abraços, carícias ou beijos.
Ferrovia está prevista para ligar norte do Mato Grosso ao sul do Pará, em prol do escoamento de grãos. Projeto passa por dentro de terras indígenas e áreas preservadas e tem oposição de lideranças kaiapós e mundurukus.
Com informações da Repórter Brasil
Com um pedido oficial de desculpas a povos indígenas, o governo federal voltou à carga para destravar a polêmica Ferrogrão – sonho antigo dos produtores de soja e milho do centro-oeste e um dos mais ambiciosos projetos de logística do país. Totalizando 933 km de extensão, a ferrovia teria início no município de Sinop (MT), base da produção nacional de grãos, e cruzaria a Amazônia até chegar ao porto de Itaituba (PA), no rio Tapajós.
A reportagem teve acesso a um "pedido de retratação" que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), órgão federal responsável por gerenciar as concessões do setor logístico, apresentou em uma reunião realizada nesta quarta-feira (7 de fevereiro) em Brasília (DF), com lideranças indígenas do Instituto Kabu.
A organização do povo Kayapó Mekrãgnotí atua na defesa de indígenas das proximidades da rodovia BR-163, principal via de escoamento do agro no centro-oeste. A Ferrogrão seria construída paralelamente à estrada.
Segundo a ANTT, a agência quer garantir "o processo de consulta prévia, livre e informada, conforme previsto na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), a qual, infelizmente, não foi devidamente observada".
Com 933 km de extensão, Ferrogrão vai de Sinop (MT) a Itaituba (PA). Arte: Débora De Maio
Com o reposicionamento, o governo deixou claro que pretende levar adiante o projeto, ideia criada há mais de uma década, ainda no primeiro governo da então presidente Dilma Rousseff (PT), pelas grandes tradings de grãos que atuam no país: Amaggi, ADM, Bunge, Cargill e Dreyfus.
Não por acaso, o projeto há anos figura entre as prioridades da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja), instituição já presidida, no Mato Grosso, pelo atual ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.
"Esse projeto é de interesse nacional e deve ser realizado de maneira sustentável, considerando as melhores decisões socioambientais para a região e para todas as comunidades que a habitam", afirma a ANTT, em documento assinado em 26 de janeiro. "Uma vez concluída, a Ferrogrão terá uma capacidade de transporte significativa, proporcionando competitividade no escoamento da produção pelo Arco Norte".
Liderança da aldeia Baú e responsável pelas relações públicas do Instituto Kabu, Mydjere Kayapó afirmou à reportagem que a reunião e a retratação não significam a aceitação do projeto. "Não é por causa de uma carta de desculpas que diremos sim para a Ferrogrão. Isso não deve só a mim, mas a todos os indígenas que sempre foram desrespeitados nesse processo", disse.
A tentativa de aproximação do governo com os indígenas procura vencer uma etapa paralisada em 2021, quando o processo de licenciamento da obra – estimada hoje em aproximadamente R$ 30 bilhões – foi paralisado por ordem do STF.
Naquela ocasião, o ministro Alexandre de Moraes deu uma cautelar contra o projeto, ao atender uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) apresentada pelo PSOL. A legenda questionava a redução dos limites do Parque Nacional Jamanxim, uma unidade de conservação ambiental no Pará, para a construção da Ferrogrão. Por decisão da própria corte, é proibido alterar limites de unidades para passagem de obras.
Lula e cacique Raoni Metuktire, do povo kaiapó, durante Acampamento Terra Livre em 2023. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Indígenas não ouvidos
O pedido de desculpas faz referência a uma sessão pública do empreendimento realizada em 12 de dezembro de 2017, em Brasília, na gestão do então presidente Michel Temer, para tratar do licenciamento da obra. Na ocasião, os indígenas não foram ouvidos. No encontro desta quarta-feira, representantes do Ministério dos Transportes e da ANTT se reuniram em Brasília com as lideranças indígenas, para oficializar a retratação.
Na prática, porém, o encontro, que teve participação da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), simboliza mais do que um mero pedido de perdão. Em defesa da ferrovia, a agência reguladora destaca, inclusive, o apelo ambiental do projeto, apesar das preocupações de ativistas com os impactos sobre o ecossistema local.
"Este empreendimento contribuirá para o desenvolvimento nacional, alinhando-se a projetos estratégicos de infraestrutura de transportes, ao mesmo tempo em que respeitará o meio ambiente, promovendo a redução das emissões de CO² na atmosfera, em conformidade com a agenda ESG (ambiental, social e governança) do governo federal e os padrões estabelecidos pela Climate Bond Initiative (CBI) para certificação de iniciativas sustentáveis."
Apesar de o Brasil ser signatário da Convenção 169 da OIT, o processo de consulta prévia nunca foi efetivamente respeitado no país. O que está em jogo, porém, é saber se os indígenas teriam, ou não, poder de veto ao projeto, a partir do diagnóstico de seus impactos.
Fila de caminhões carregados de soja na BR-163 com destino ao porto de Miritituba, em Itaituba (PA). Foto: João Laet/Repórter Brasil
Busca de diálogo
Durante o encontro com as lideranças indígenas, o subsecretário de sustentabilidade do Ministério dos Transportes, Cloves Eduardo Benevides, disse que não está definido se a obra será bancada por recursos públicos, se será uma concessão, ou uma Parceria Público-Privada (PPP). "Não há um desenho final, o que há é um debate público", comentou.
O plano ferroviário retomado por Lula contraria frontalmente seu maior aliado quando o assunto é a representação dos povos indígenas: o cacique Raoni Metuktire. O líder indígena de 93 anos, que subiu a rampa do Planalto ao lado do presidente na cerimônia de sua posse, em janeiro de 2023, vive na região a ser cortada pela Ferrogrão.
Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) já demonstraram que a criação de um terminal de cargas da Ferrogrão em Matupá, no norte do Mato Grosso, pode partir ao meio as terras indígenas do Xingu. É nesse ponto que a Ferrogrão afeta a Terra Indígenea Capoto Jarina, onde mora o cacique Raoni. A rodovia MT-232 atravessa trechos da Capoto Jarina e também do Parque Indígena do Xingu, que abriga 16 povos indígenas.
Mydjere Kayapó afirmou que seu povo tem um protocolo de consulta prévia. "Nós sabemos que, mesmo se dissermos não, eles estarão lá para construir. Então, queremos atuar para que não aconteça o que vimos em Belo Monte", comentou, referindo-se ao conturbado processo de licenciamento da hidrelétrica erguida no rio Xingu, no Pará.
"Não somos contra o desenvolvimento do Brasil, mas não aceitaremos que nosso direito seja atropelado e ignorado. Eles precisam fazer novos estudos da ferrovia e, antes de tudo, nos ouvir",
defendeu a liderança.
Presidente da Associação Indígena Apiaká Iakunda'Y da comunidade Pimental, em Trairão (PA), Irleusa Robertino disse à reportagem que o povo indígena espera que as audiências sejam realizadas nas aldeias. "Não descansamos para fazer parte dessa discussão e queremos defender os direitos de nosso povo. Essas reuniões devem acontecer nos municípios diretamente afetados. Estamos solicitando isso", comentou.
"Apresentamos os protocolos de consulta dos povos Kayapó, Munduruku e Apiaká. Queremos ser ouvidos".
Irleusa Robertino
Brent Millikan, membro da secretaria executiva da organização GT Infra e Justiça Ambiental, que acompanhou a reunião com os indígenas, diz que o saldo é positivo. "Ao menos, vemos agora um espírito democrático de abrir o tema para o debate, em vez da tentativa de atropelar e fingir que havia consulta", comentou.
Em sua avaliação, as polêmicas da Ferrogrão expõem o contexto emblemático de como é feito o planejamento de grandes obras em territórios sensíveis. "São problemas crônicos. É preciso aprimorar o tema da viabilidade econômica e socioambiental do projeto, incluindo temas como o impacto cumulativo com outros empreendimentos, como a BR-163, a hidrovia do Tapajós, até considerando a possibilidade de não fazer a ferrovia", disse.
Disputa bilionária
Fora da arena ambiental, a Ferrogrão também divide interesses bilionários de empresas do setor ferroviário. Empresas como a VLI, braço logístico da mineradora Vale, querem que o projeto avance, para consolidar suas operações de transporte rumo ao "arco Norte" da Amazônia. Há, no entanto, fortes oponentes a essa ideia.
A Rumo, empresa do grupo Cosan que administra ferrovias nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, assumiu bilhões de reais em novos investimentos na malha que já controla e teme que a nova abertura logística impacte seus negócios. Por isso, atua nos bastidores com posição contrária ao empreendimento.
Representantes de caminhoneiros também atuam contra o projeto, por temerem que o transporte de carga que hoje fazem pela BR-163 migre para os trilhos da ferrovia e inviabilize o modal rodoviário.
No ano passado, a Ferrogrão foi incorporada ao PAC 3 e passou a ser alvo de uma "análise dedicada", conforme mencionou o chefe da Casa Civil, ministro Rui Costa. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já declarou, porém, que o projeto depende da comprovação de sua viabilidade ambiental.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Repórter Brasil, escrito por André Borges.