Exploração de petróleo avança na Amazônia sem ouvir comunidades indígenas
Foto: Agência Brasil
Licença concedida pelo Ibama à Petrobras isolou Funai em espaço de decisão; AGU defende processo, enquanto lideranças criticam
A licença concedida à Petrobras para avançar com pesquisas para a exploração de petróleo na Amazônia deixou de ouvir comunidades indígenas diretamente afetadas pelos empreendimentos na Margem Equatorial.
Ao R7, representantes indígenas, servidores da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e pessoas que já atuaram no processo de liberações de licenças pelo Ibama reclamam da falta de diálogo e de incerteza sobre qual órgão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria atuado para acelerar a liberação da licença.
Uma das maiores reivindicações é apontada por Luene Karipuna, que vivia na região do baixo rio Oiapoque, no Amapá, mas deixou o local após ter iniciado ativismo contra a exploração de petróleo. Ela afirma que houve afastamento de comunidades ao longo de toda análise do licenciamento.
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“O processo de consulta prévia nunca foi feito. O que há são tentativas de burlar isso”, diz. Ela questiona que a Funai tenha sido afastada do processo, algo definido pela AGU (Advocacia-Geral da União) em parecer técnico de 2023.
Na época, o órgão entendeu que a análise da licença era de competência exclusiva do Ibama, sem necessidade de aval da Funai. A decisão se baseou no fato de que o bloco 59 — que será pesquisado na Foz do Amazonas — fica a mais de 200 quilômetros da terra indígena mais próxima.
No entanto, um dos técnicos que atuou no processo indicou, sob reserva, que o Ibama buscou contato com a Funai, mesmo isso não sendo necessário, conforme a decisão da AGU.
“Até os dias atuais a Funai é excluída dos acompanhamentos, porque é dito que é uma exploração offshore, que não está perto de nenhum território indígena, que não haverá impacto”, afirma Luene, que considera haver impacto direto do empreendimento — devido aos riscos de desmatamento e aos possíveis efeitos sobre a biodiversidade e a atividade pesqueira da comunidade.
A decisão da AGU também é questionada por técnicos da Funai que atuam na área de liberação de licenças. Em relatos feitos sob reserva à reportagem, servidores consideram que a decisão teria sido política e com objetivo de acelerar o processo de autorização para exploração de petróleo.
Na prática, a avaliação é de que o processo avançou mais rapidamente por ter permanecido exclusivamente sob a responsabilidade do Ibama. Se tivesse passado pela Funai, os técnicos da fundação também teriam de emitir um parecer para autorizar a licença relacionada à Foz do Amazonas — o que poderia alongar o prazo e elevar o risco de uma negativa.
Essa perspectiva também é confirmada por técnicos que atuaram no processo no Ibama, segundo apurou o R7.
A concessão da licença deveria ter levado em consideração a opinião dos indígenas por ter impacto às comunidades, reforça a Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama.
“Os indígenas podem ser afetados não apenas por um eventual acidente na perfuração, mas também por efeitos negativos da futura exploração em termos de afluxo populacional para a região, por exemplo”, diz. “Discordo que reuniões feitas pela Petrobras com os indígenas sejam equivalentes a uma ‘licença social’, como consta no parecer”, sustenta.
Luene Karipuna considera que o Brasil deveria apostar em um processo de transição energética que conceda espaço de diálogo entre as ações e povos indígenas.
“Acreditamos que, para a transição energética acontecer no Brasil e para o Brasil liderar o mundo com essa transição, nós precisamos começar eliminando os combustíveis fósseis no Brasil, na Amazônia”, conclui.
O QUE DIZ A AGU
Em nota enviada ao R7, a AGU disse que a “competência para licenciar um empreendimento deve ser concentrada e operacionalizada por um único ente federado, seja o município, o estado ou a União, a depender do tipo e abrangência do empreendimento”, de acordo com previsão da legislação brasileira.
Segundo o órgão, a consulta à Funai sobre concessão de licenças não está prevista na legislação ambiental.
A Funai afirmou ter enviado manifestação ao Ibama, com pedido para que o processo de licença considerasse o impacto às terras indígenas, mas destaca que a solicitação não foi atendida pela distância de aproximadamente 205,31 km até a terra indígena Jumina, que é a mais próxima da região a ser pesquisada.
Ao autorizar a licença para pesquisa na Foz do Amazonas, em 20 de outubro, o Ibama disse que a emissão se deu após “rigoroso processo de licenciamento”, que contou com estudo de impacto ambiental, realização de audiências públicas e reuniões técnicas setoriais entre municípios do Pará e do Amapá.
O instituto também destacou que o processo exigiu que a Petrobras construísse um Centro de Reabilitação e Despetrolização de Fauna, no Oiapoque. O local funciona como ponto estratégico em caso de eventual necessidade de atendimento à fauna e flora da região.
A reportagem questionou a Petrobras se houve consulta a comunidades indígenas e sobre o parecer concedido pela AGU para dispensar a opinião da Funai, mas a empresa não respondeu até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para atualização em caso de retorno.
Fonte: R7


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