Geração terapia: entenda por que os millennials traem menos

Publicado em: 15/12/2025 22:54
Geração terapia: entenda por que os millennials traem menos
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A geração millennial (nascidos entre 1981 e 1996) repensa a fidelidade e evita casos, um dos motivos, no entanto, chama a atenção

A geração que cresceu com aplicativos de namoro, redes sociais onipresentes e uma linguagem terapêutica incorporada ao cotidiano pode estar se envolvendo menos em traições. Não necessariamente por uma superioridade moral, mas por exaustão. Para muitos millennials, simplesmente não sobra energia.

 

Entre jornadas de trabalho intensas, aluguéis cada vez mais caros e o esforço para sustentar relações estáveis, somam-se ainda a terapia, a rotina de exercícios e a tentativa de manter algum equilíbrio pessoal. Nesse cenário, um caso extraconjugal deixa de ser tentador e passa a parecer apenas mais uma tarefa impossível de administrar.

 

Mesmo com a tecnologia ampliando o acesso a potenciais parceiros — de aplicativos a redes sociais —, cresce a percepção de que a infidelidade perdeu espaço entre os nascidos de 1981 a 1996. Ansiedade financeira, desgaste emocional e mudanças culturais sobre o que se espera de um relacionamento ajudam a explicar o fenômeno.

 

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O debate ganhou força após um trecho do podcast australiano Mamamia Out Loud viralizar nas redes sociais em novembro. As apresentadoras comentaram que, embora nunca tenha sido tão fácil trair do ponto de vista logístico, os millennials parecem simplesmente não fazê-lo com tanta frequência. As explicações levantadas vão de fatores econômicos a transformações profundas na forma de se relacionar.Nos comentários, muitos ouvintes — em especial millennials — reagiram com ironia e cansaço. Houve quem brincasse sobre a falta de tempo e disposição para “administrar” outra relação, enquanto outros destacaram que, hoje, mal é possível sustentar uma única vida familiar.

 

Embora seja difícil medir com precisão os índices globais de infidelidade, dados por geração reforçam essa impressão. Uma análise de 2017 do sociólogo Nicholas Wolfinger, do Instituto de Estudos da Família, apontou que americanos acima de 55 anos, especialmente os nascidos entre 1940 e 1959, relataram as maiores taxas de traição. A Geração Z, por sua vez, apresenta índices superiores aos dos millennials, além de maior renda disponível em média.

 

 

Para a terapeuta familiar Lisa Chen, ter um caso hoje exige um tipo de investimento que muitos millennials não conseguem fazer. “A infidelidade virou um projeto emocional paralelo”, afirmou à Newsweek. “E essa geração já está sobrecarregada com burnout, custo de vida alto, instabilidade política e pressão profissional. Muitas vezes, falta energia até para um único relacionamento.”

 

Segundo Chen, os vínculos atuais demandam mais presença emocional, comunicação constante e vulnerabilidade do que no passado — o que torna ainda mais difícil sustentar duas relações ao mesmo tempo. Além disso, a própria tecnologia atua como freio: compartilhamento de localização, histórico de mensagens e redes sociais tornam o risco de ser descoberto muito maior.

 

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O esgotamento não é apenas percepção. O Relatório WorkForces 2024, da Aflac, mostra que 66% dos millennials entre 29 e 44 anos relatam níveis moderados a altos de burnout — acima da Geração X e muito acima dos baby boomers. Já um estudo do aplicativo financeiro Piere revelou que 59% adiaram marcos importantes da vida, como casamento ou filhos, por dificuldades econômicas.

 

Apesar de serem a geração mais escolarizada, os millennials também estão entre as mais pressionadas financeiramente. Muitos entraram no mercado de trabalho após a crise de 2008 e nunca se recuperaram totalmente. No Reino Unido, ganham menos aos 30 anos do que gerações anteriores; nos EUA, acumulam cerca de 30% menos riqueza aos 35 anos do que os baby boomers tinham na mesma idade. Até a conta do supermercado pesa: em uma década, o gasto médio semanal subiu mais de 30%.

 

Para a psicóloga clínica Sabrina Romanoff, especialista em relacionamentos, essa geração também aprendeu observando. “Os millennials viram de perto os efeitos do divórcio e da infidelidade em suas famílias”, disse. Isso teria levado a escolhas mais conscientes de parceiros, menos tolerância à traição e mais disposição para lidar diretamente com necessidades emocionais não atendidas.

 

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Fotos: Reprodução

 

Romanoff destaca ainda que relacionamentos duradouros deixaram de ser uma obrigação social. “Quando alguém escolhe esse tipo de vínculo hoje, tende a fazê-lo com mais intenção e compromisso”, afirmou. O enfraquecimento dos chamados “terceiros espaços” — como bares, clubes e centros comunitários, especialmente após a pandemia — também reduziu oportunidades para encontros fora do relacionamento principal.

 

A popularização da terapia e da cultura digital de autoconsciência completa o quadro. Para Chen, os millennials são “a geração da terapia”, mais atentos aos impactos psicológicos da traição, não apenas como falha moral, mas como gatilho para sofrimento emocional.

 

Nem todos, porém, atribuem a queda da infidelidade ao cansaço. A terapeuta sexual Jasmonae Joyriel aponta que muitos millennials estão redefinindo o conceito de fidelidade. Modelos como não monogamia consensual, poliamor e arranjos flexíveis ganham espaço, reduzindo a necessidade de quebrar acordos.

 

Segundo Joyriel, a comunicação mais aberta e o fato de muitos casais se formarem mais tarde, com maior autoconhecimento, diminuem comportamentos impulsivos. Ainda assim, ela alerta contra simplificações: períodos de estresse costumam, historicamente, aumentar — e não reduzir — a incidência de traições.

 

 

Mesmo com divergências entre especialistas, o sentimento expresso nas redes sugere uma mudança real. Como resumiu um comentarista millennial no podcast que reacendeu o debate: “Acho que a gente valoriza, de verdade, gostar da pessoa com quem está”.

 

Fonte: Metrópoles

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